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Lavagem de dinheiro - III


Amigos,

Continuamos nossos comentários sobre as recentes alterações na Lei de Lavagem de Dinheiro.

Vejamos o nosso quadro comparativo:

ANTES
DEPOIS
 Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:
        I – obedecem às disposições relativas ao procedimento comum dos crimes punidos com reclusão, da competência do juiz singular;
        II - independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes referidos no artigo anterior, ainda que praticados em outro país;
        III - são da competência da Justiça Federal:
        a) quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas;
        b) quando o crime antecedente for de competência da Justiça Federal.
              § 1º A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência do crime antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor daquele crime.
        § 2º No processo por crime previsto nesta Lei, não se aplica o disposto no art. 366 do Código de Processo Penal.
       Art. 3º Os crimes disciplinados nesta Lei são insuscetíveis de fiança e liberdade provisória e, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.  

Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:
        I – obedecem às disposições relativas ao procedimento comum dos crimes punidos com reclusão, da competência do juiz singular;
        II - independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade de processo e julgamento(Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)
        III - são da competência da Justiça Federal:
        a) quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas;
        b) quando a infração penal antecedente for de competência da Justiça Federal.  (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)
       § 1o  A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência da infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)
        § 2o  No processo por crime previsto nesta Lei, não se aplica o disposto no art. 366 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), devendo o acusado que não comparecer nem constituir advogado ser citado por edital, prosseguindo o feito até o julgamento, com a nomeação de defensor dativo.  (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)
        Art. 3º Os crimes disciplinados nesta Lei são insuscetíveis de fiança e liberdade provisória e, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.  (Revogado pela Lei nº 12.683, de 2012)



A primeira alteração relevante é a ocorrida no inciso II do art. 2.º, onde passou a constar que a lavagem de dinheiro independe do “processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país”. Isto é, ainda que não haja mais um rol de crimes no art. 1.º  e que qualquer infração penal (crime ou contravenção) possa constituir antecedente deste delito, continua a existir esta relação de independência e autonomia na apuração entre a lavagem e os delitos antecedentes.

Afinal, uma das principais características do processamento deste delito é que, embora exista evidente conexão (art.  76, II e III, CPP) entre a infração penal antecedente e a lavagem de dinheiro, a norma especial determina esta desnecessidade de julgamento conjunto, justamente porque é possível que o delito antecedente tenha sido praticado em outro pais, tendo em vista a característica transnacional da lavagem.

Contudo, sendo possível o julgamento conjunto, é preciso analisar a conveniência deste, competindo ao juiz competente para o julgamento do crime de lavagem, desde o advento da Lei 12.683/12,  “a decisão sobre a unidade de processo e julgamento”.

No que pertine à alínea b do inciso III, a alteração deve-se, mais uma vez, à eliminação do rol de crimes antecedentes de lavagem de dinheiro. Atualmente, configura crime de lavagem de dinheiro o ato de ocultar a origem de patrimônio advindo de qualquer infração penal (crime ou contravenção). Assim, se, antes, não constituía lavagem de dinheiro dissimular a propriedade de bens provenientes do tráfico internacional de pessoa para o fim de prostituição (art. 231 do CP), hoje sobre tal ato incidiria o art. 1º da Lei 9.613/98.

O § 1.º, por sua vez, deixou claro que a lavagem de dinheiro será punível, mesmo que “extinta a punibilidade da infração penal antecedente”, o que se afigura extremamente relevante diante da percepção de que passou a constituir lavagem de dinheiro a ocultação da origem de valores provenientes da sonegação fiscal, que não constava no rol de crimes antecedentes daquele delito. Assim, mesmo que o pagamento do crédito tributário e seus acessórios, historicamente, tenha implicado na extinção de punibilidade do delito tributário, tal benesse não será estendida à lavagem de dinheiro.

Já a alteração no § 2.º veio a deixar mais clara a inaplicabilidade do art. 366 do Código de Processo Penal à Lavagem de Dinheiro. Afinal, neste delito, a não localização do acusado e a sua citação por edital não implicarão na suspensão do processo, que deverá prosseguir até seu julgamento, com a nomeação de defensor dativo, de sorte a assegurar o devido processo legal e a ampla defesa.

De se salientar que a inaplicabilidade do art. 366 do CPP ao crime de lavagem de dinheiro deve-se ao fato deste delito ter como objetivo o confisco do produto da infração penal antecedente, como salienta Sérgio Fernando Moro (Crime de lavagem de dinheiro. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 97).

Por fim, a revogação do art. 3º veio ao encontro de entendimento jurisprudencial reiterado, no sentido de que a gravidade em abstrato de delito não pode justificar a vedação da liberdade provisória se ausentes os requisitos da prisão preventiva, o que já havia justificado a alteração da Lei dos Crimes Hediondos pela Lei 11.464/07.

A alteração, por sinal, foi extremamente feliz, pois passou a permitir que a liberdade provisória se dê mediante  a concessão de fiança, que se revela uma forma eficaz de garantir o comparecimento do acusado ao processo,  comprometendo a capacidade financeira do acusado ou do próprio grupo criminoso.

Amanhã, prosseguiremos na análise de mais dispositivos.


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