Caros Amigos,
Consta no art. 109, VI, da
Constituição Federal que “aos juízes federais compete processar e julgar: (...)
VI – os crimes contra a organização do trabalho(...)”.
Contudo, isto não quer dizer que
compete à Justiça Federal o julgamento de todos os delitos elencados no
capítulo referente aos Crimes contra a Organização do Trabalho presente no
Código Penal brasileiro. Afinal, o intento do legislador constitucional foi
remeter o julgamento de tais crimes à Justiça Federal apenas quando “violados
direitos dos trabalhadores considerados coletivamente”.
Neste sentido:
AGRAVO
REGIMENTAL EM CONFLITO DE COMPETÊNCIA. DIREITO PROCESSUAL PENAL. PROCEDIMENTO
EM QUE APURADA SUPOSTA PRÁTICA DOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTIGOS 203 E 207 DO
CÓDIGO PENAL. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À ORGANIZAÇÃO GERAL DO TRABALHO.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL QUE SE AFIRMA, CONSOANTE OS TERMOS DA SÚMULA
115 DO TRIBUNAL FEDERAL DE RECURSOS. DESPROVIMENTO.
1.
Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes perpetrados contra a
organização do trabalho, quando violados direitos dos trabalhadores
considerados coletivamente.
2.
A infringência dos direitos individuais de trabalhadores, sem que configurada
lesão ao sistema de órgãos e instituições destinadas a preservar a coletividade
trabalhista, afasta a competência da Justiça Federal. Competência do Juízo
Estadual da 1.ª Vara Criminal de Itabira/MG que se declara.
3.
Agravo desprovido.
(AgRg
no CC 64.067/MG, Rel. Ministro OG FERNANDES, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em
27/08/2008, DJe 08/09/2008)
Este,
inclusive, era o conteúdo da Súmula 115 do extinto Tribunal Federal de
Recursos:
"Compete
à Justiça Federal processar e julgar os crimes contra a organização do
trabalho, quando tenham por objeto a organização geral do trabalho ou direitos
dos trabalhadores considerados coletivamente." (Súmula nº 115/TFR)
Portanto, mesmo
que não esteja no capítulo referente aos Crimes contra a Organização do
Trabalho, o delito de redução à condição análoga a de escravo é de competência
da Justiça Federal:
PENAL
E PROCESSUAL PENAL. RÉU NÃO ENCONTRADO NO ENDEREÇO CONSTANTE DOS AUTOS.
INTIMAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA OFERECIMENTO DE CONTRARRAZÕES AO RECURSO
ESPECIAL. POSSIBILIDADE. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. INDICAÇÃO
EXPRESSA NO ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DESNECESSIDADE. CRIME DE
REDUÇÃO À CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL.
APLICAÇÃO DA SÚMULA N.º 122/STJ. CRIMES TIPIFICADOS NOS ARTS. 132 E 203 DO
CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO. ANÁLISE POR ESTE SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
INVIABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
(...)
3.
A Terceira Seção deste Sodalício Superior pacificou entendimento segundo o qual
compete à Justiça Federal processar e julgar os sujeitos ativos do crime
previsto no art. 149 do Código Penal, haja vista a violação aos direitos
humanos e à organização do trabalho.
(...)
(AgRg
no REsp 1067302/PA, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em
12/06/2012, DJe 22/06/2012)
O STF, por
sinal, vem reiterando que “o enquadramento na categoria de crimes contra a
organização do trabalho, vai além de condutas ofensivas ao sistema de órgãos e
instituições que visam a proteção dos trabalhadores”, devendo assegurar a
proteção da dignidade da pessoa humana, quando afrontada no contexto laboral.
Nesse
sentido:
EMENTA Agravo regimental no
recurso extraordinário. Penal e Processual Penal. Crimes contra a organização
do trabalho. Dignidade da pessoa humana, protegida amplamente pela Constituição
Federal, que deve ser observada. Competência da Justiça Federal. Art. 109,
inciso VI, da Carta Magna. Precedente. Necessidade do Tribunal Regional Federal
da 4ª Região prosseguir na análise das demais questões que lhe foram submetidas
e não apreciadas, em razão do acolhimento de questão preliminar de
incompetência. 1. É da mais recente jurisprudência desta Suprema Corte, o
entendimento de que, para fins de fixação da competência da justiça federal, o
enquadramento na categoria de crimes contra a organização do trabalho, vai além
de condutas ofensivas ao sistema de órgãos e instituições que visam a proteção
dos trabalhadores. A dignidade do homem, protegida amplamente pela Constituição
da República, não pode ser olvidada, devendo ser atrelada àquele componente
orgânico (RE nº 398.041/PA, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Joaquim Barbosa,
DJe de 19/12/08). 2. Restando superada a questão preliminar de incompetência,
deve o Tribunal Regional Federal da 4ª Região prosseguir na análise das demais
questões levadas à sua apreciação nos autos do writ ali impetrado. 3. Agravo
regimental parcialmente provido.
(RE 587530 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 03/05/2011, DJe-164 DIVULG 25-08-2011 PUBLIC 26-08-2011 EMENT VOL-02574-02 PP-00432)
(RE 587530 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 03/05/2011, DJe-164 DIVULG 25-08-2011 PUBLIC 26-08-2011 EMENT VOL-02574-02 PP-00432)
Contudo, o
aliciamento de apenas três trabalhadores não configura lesão à ordem do
trabalho como um todo, constituindo, em verdade, lesão a direitos individuais.
Neste sentido:
CONFLITO
DE COMPETÊNCIA. CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO. LESÃO A
DIREITO DOS TRABALHADORES COLETIVAMENTE CONSIDERADOS OU À ORGANIZAÇÃO GERAL DO
TRABALHO. NÃO OCORRÊNCIA. COMPETÊNCIA JUSTIÇA ESTADUAL.
I.
Hipótese em que a denúncia descreve a suposta prática do delito de aliciamento
para o fim de emigração perpetrado contra 3 (três) trabalhadores individualmente
considerados.
II.
Compete à Justiça Federal o julgamento dos crimes contra a organização do
trabalho desde que demonstrada a lesão a direito dos trabalhadores
coletivamente considerados ou à organização geral do trabalho.
III.
Conflito conhecido para declarar a competência da Justiça Estadual.
(CC
107.391/MG, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/10/2010,
DJe 18/10/2010)
Da mesma forma,
a frustração de direito trabalhista individualmente considerados é crime de
competência da Justiça Estadual, como demonstra o acórdão abaixo transcrito:
CONFLITO
DE COMPETÊNCIA. PENAL. INTERESSE INDIVIDUAL DE TRABALHADOR. COMPETÊNCIA
DA JUSTIÇA ESTADUAL.
1.
"Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes contra a
organização do trabalho, quando tenham por objeto a organização geral do
trabalho ou direitos dos trabalhadores considerados coletivamente."
(Súmula nº 115/TFR)
2. Tratando-se de interesses individuais dos trabalhadores,
a competência para julgamento é da Justiça Estadual.
3.
Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito do Departamento
de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária de São Paulo, o suscitado.
(CC
98.029/SP, Rel. Ministro HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE),
TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/09/2010, DJe 21/09/2010)
Isto é, “para a caracterização do crime contra a
organização do trabalho, o delito deve atingir a liberdade individual dos
trabalhadores, como também a Organização do Trabalho e a Previdência, a ferir a
própria dignidade da pessoa humana e colocar em risco a manutenção da
Previdência Social e as Instituições Trabalhistas, evidenciando a ocorrência de
prejuízo a bens, serviços ou interesses da União, conforme as hipóteses
previstas no art. 109 da CF, o que não se verifica no caso vertente”.
Assim, mesmo os distúrbios de um movimento paredista local escapam da
competência federal, como demonstra o julgado a seguir:
AGRAVO
REGIMENTAL EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ATENTADO CONTRA A LIBERDADE DO TRABALHO.
CRIME CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO. INOCORRÊNCIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
ESTADUAL.
1.
No caso dos autos, o movimento grevista instaurado por servidores municipais,
promovendo desordem, e impedindo, mediante ameaças e utilização de força
física, o ingresso de servidores no local de trabalho, bem como a retenção de
equipamentos necessários à execução dos serviços, sobretudo os essenciais, não
configura crime contra a organização do trabalho.
2.
Para a caracterização do crime contra a organização do trabalho, o delito deve
atingir a liberdade individual dos trabalhadores, como também a Organização do
Trabalho e a Previdência, a ferir a própria dignidade da pessoa humana e
colocar em risco a manutenção da Previdência Social e as Instituições
Trabalhistas, evidenciando a ocorrência de prejuízo a bens, serviços ou
interesses da União, conforme as hipóteses previstas no art. 109 da CF, o que
não se verifica no caso vertente.
3.
Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no CC 62.875/SP, Rel. Ministro
OG FERNANDES, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 22/04/2009, DJe 13/05/2009)
Por fim,
segundo a jurisprudência do STJ, compete à Justiça Estadual julgar o crime de
omissão de registro empregatícia em CTPS, da mesma forma como a frustração de
direitos trabalhistas, quando os interesses atingidos são individuais.
CONFLITO
NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ARTS. 203 e 297, § § 3º e 4º, DO ESTATUTO REPRESSIVO.
FRUSTRAÇÃO DE DIREITOS TRABALHISTAS. OMISSÃO DE REGISTRO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO
EM CARTEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.
1.
A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça vem decidindo que compete à
Justiça Estadual processar e julgar os crimes de falsificação de documento
público, consistente na omissão de anotação de período de vigência do contrato
de trabalho de único empregado, consoante o disposto na Súmula 62⁄STJ, e
frustração de direitos trabalhistas, tendo em vista a ausência de lesão a bens,
serviços ou interesse da União,
2.
Ressalva do posicionamento deste relator, no sentido de que a conduta descrita
no delito capitulado no § 4º do art. 297 do Código Penal, tem como principal
sujeito passivo do crime a Autarquia Previdenciária, e secundariamente o
trabalhador, razão pela qual a competência seria da Justiça Federal.
3.
Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da Vara
Criminal de Pato Branco-PR, o suscitante.
(CC
96.365 – PR, Min. Jorge Mussi, julgado em 26/05/2010)
Neste mesmo
sentido, a Súmula 62 do STJ:
Súmula
62 Compete à Justiça Estadual processar e julgar o crime de falsa anotação na
Carteira de Trabalho e Previdência Social, atribuído à empresa privada.
Fica a dica.
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