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Pode-se reiterar em recurso ordinário matéria já debatida em habeas corpus?



Caros Amigos,

Hoje comentaremos o julgamento do recurso ordinário constitucional em habeas corpus n.º 37.895/RS, de relatoria da Min. Laurita Vaz, pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça.

No caso, o paciente havia impetrado habeas corpus perante o TJ/RS, questionando decreto de prisão preventiva em seu desfavor. Diante da denegação da ordem, restou impetrado novo habeas corpus, desta vez ao STJ (HC 269.773/RS).

Em decisão monocrática, a ação constitucional restou liminarmente rejeitada diante da existência de recurso ordinário a afastar a necessidade da via excepcional. Contudo, o mérito da questão restou enfrentado para concluir que inexistia ilegalidade a justificar a concessão de ofício da ordem.

Há que se salientar, entretanto, que a decisão do TJ/RS foi igualmente impugnada através de recurso ordinário constitucional, o que suscitou o seguinte questionamento: considerando-se que o mérito (cabimento da prisão preventiva) já foi apreciado na decisão que não conheceu o habeas corpus, justifica-se a análise do mérito do recurso ordinário constitucional?

A Quinta Turma respondeu à questão negativamente. Segundo a Min. Laurita Vaz:

Com efeito, a pretensão recursal versa mera reiteração do que requerido no HC 269.773⁄RS, Rel. Min. LAURITA VAZ (decidido, por mim, em 8 de maio de 2013). Isso porque há identidades de partes, de pedido de causa de pedir, impugnando os dois feitos a mesma prisão processual.

E, como se sabe, não podem ser processados nesta Corte, concomitantemente, habeas corpus e recurso ordinário em habeas corpus nos quais se constata litispendência, instituto que se configura exatamente quando há igualdade de partes, de objeto e de causa petendi.

Portanto, o presente recurso não pode ser conhecido, ante a caracterização de litispendência – mormente na espécie, em que o fundo do pedido já foi analisado, ainda que em decisão monocrática, de minha lavra.

Explicite-se: se a petição inicial do habeas corpus anterior foi indeferida liminarmente devido à inadequação da via eleita, porém, na ocasião, a matéria de fundo foi analisada, mesmo que, monocraticamente, o posterior recurso ordinário que versa mera reiteração do que requerido naquele habeas corpus não pode ser apreciado.

Isso porque o reconhecimento da litispendência visa precipuamente à economia processual e ao "propósito de evitar a ocorrência de decisões contraditórias" (STJ, REsp 88.354⁄SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Primeira Turma, DJ 02⁄09⁄1996).

Nesse sentido, mutatis mutandis:

"AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL E CORRUPÇÃO DE MENORES. PRISÃO CAUTELAR. FUNDAMENTAÇÃO E EXCESSO DE PRAZO. WRIT IDÊNTICO A RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO EM FAVOR DO MESMO ACUSADO E COM OS MESMOS FUNDAMENTOS. REITERAÇÃO DE PEDIDOS. DECISÃO QUE DEVE SER MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.
1. Deve ser mantida por seus próprios fundamentos a decisão que, monocraticamente, nega seguimento a writ que se apresenta como reiteração de recurso ordinário interposto em favor do mesmo paciente, com o mesmo pedido e causa de pedir.
2. Agravo regimental improvido." (AgRg no HC 275.523⁄SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 15⁄10⁄2013, DJe 28⁄10⁄2013.)

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM REINTEGRAÇÃO DE POSSE. REITERAÇÃO DE PEDIDO FORMULADO EM HABEAS CORPUS ANTECEDENTE. LITISPENDÊNCIA.
1. Configura litispendência a reiteração de pedido idêntico ao formulado em habeas corpus antecedente que ainda se encontra em curso.
2. Recurso ordinário não provido." (RHC 36.788⁄SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Terceira Turma, julgado em 06⁄06⁄2013, REPDJe 02⁄08⁄2013, DJe 17⁄06⁄2013.)

Vale ainda ressaltar que não se veda à Defesa o bônus de impetrar mandamus incabível, na busca da sorte da concessão de ordem de habeas corpus de ofício. Nesse caso, porém, pode eventualmente ter de arcar com o ônus de o recurso ordinário – embora trate-se da correta via de impugnação – não ter seu pedido de mérito analisado pelo Colegiado.

Porém, a Defesa insiste para que o mérito da controvérsia seja novamente analisado por esta Corte. Chegou ao ponto de impetrar habeas corpus perante o Supremo Tribunal Federal visando a esse propósito.

No ponto, deve a parte ora Recorrente ter em conta que o acesso ao Judiciário não pode dar-se de forma indiscriminada, e deve ser conduzido com ética e lealdade. Por tal razão, o legislador ordinário, por intermédio da Lei n.º 10.358⁄01, alterou o art. 14 do Código de Processo Civil, o qual passou a constar com a seguinte redação:

"Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo:
I - expor os fatos em juízo conforme a verdade;
II - proceder com lealdade e boa-fé;
III - não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de fundamento;
IV - não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou defesa do direito.
V - cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final.
Parágrafo único. Ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, a violação do disposto no inciso V deste artigo constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa; não sendo paga no prazo estabelecido, contado do trânsito em julgado da decisão final da causa, a multa será inscrita sempre como dívida ativa da União ou do Estado."

Vê-se, assim, que a lealdade processual é dever dos Magistrados, membros do Ministério Público, Partes, Advogados, Peritos, Serventuários da Justiça e Testemunhas, por ser o processo instrumento de efetivação das normas, com a finalidade primordial de manutenção do equilíbrio social, cabendo ao Magistrado competente verificar se os ditames do princípio da lealdade estão sendo observados pelos agentes processuais.

É consectário de tal Princípio a impossibilidade de a Defesa pleitear pretensões descabidas, inoportunas, tardias ou já decididas, que contribuam com a abarrotamento dos Tribunais, como na espécie.

Ante o exposto, NÃO CONHEÇO do recurso.
   
Recomenda-se a leitura do inteiro teor do julgado. Fiquem conosco!

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