Caros Amigos,
Para caracterização do delito de apropriação indébita de contribuição previdenciária
(art. 168-A), é preciso apenas o dolo direto (vontade livre e consciente de não
recolher o valor descontado) ou é imprescindível a presença do dolo específico
(presença do ânimo de apropriação ou animus
hem sibi habendi)?
A presente indagação tem aparecido com certa frequência na
jurisprudência. Afinal, muito embora a redação do dispositivo indique se tratar
de crime omissivo próprio, isto é, com dolo direto, sua localização topográfica
sugeriria que o referido tipo seria uma subespécie do art. 168 do Código Penal,
que exige o ânimo de apropriação.
Pois bem. Entre a localização topográfica do tipo e sua redação, vem
prevalecendo a última, como demonstra o presente extrato do Informativo 526 do
STJ:
DIREITO PENAL. DOLO NO DELITO DE
APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA.
Para a
caracterização do crime de apropriação indébita de contribuição previdenciária
(art. 168-A do CP), não há necessidade de comprovação do dolo específico de se
apropriar de valores destinados à previdência social. Precedentes
citados: HC 116.032-RS, Quinta Turma, DJ 9/3/2009; e AgRg no REsp 770.207/RS,
Sexta Turma, DJe 25/5/2009. AgRg no Ag 1.083.417-SP, Rel. Min. Og
Fernandes, julgado em 25/6/2013.
Veja-se,
contudo, que não se trata de posicionamento consolidado há longa data pela
Sexta Turma. Afinal, até recentemente, aquele colegiado decidia no sentido da
necessidade da presença do animus rem sibi habendi.
Neste sentido:
PENAL. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA
DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. DOLO ESPECÍFICO. DEMONSTRAÇÃO. NECESSIDADE.
FALTA DE DESCRIÇÃO DA CONDUTA. SIMPLES CONDIÇÃO DE DIRETOR DA PESSOA JURÍDICA.
INÉPCIA. RECONHECIMENTO.
1 - O tipo do art. 168-A do
Código Penal, que sucedeu o art. 95, "d" da Lei nº 8.212/1991, embora
tratando de crime omissivo próprio, não se esgota somente no "deixar de
recolher", isto significando que, além da existência do débito, haverá a
acusação de demonstrar a intenção específica ou vontade deliberada de pretender
algum benefício com a supressão ou redução, já que o agente "podia e
devia" realizar o recolhimento.
2 - A simples condição de diretor
da pessoa jurídica, sem demonstração de qualquer liame entre a conduta do
recorrente e o resultado increpado, denota inépcia da denúncia, com violação ao
art. 41 do Código de Processo Penal, ainda mais porque há dúvidas se foi mesmo
dirigente da empresa tida por sonegadora.
3 - Recurso ordinário provido
para, reconhecendo a inépcia da denúncia contra o paciente, trancar-lhe a ação
penal.
(RHC 28.611/SP, Rel. Ministra
MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe
13/09/2013)
A Quinta Turma,
contudo, entendia pela desnecessidade da presença do dolo específico, como
demonstra o julgado abaixo elencado:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO
ESPECIAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. AFASTAMENTO DA AUTORIA DELITIVA
E APLICAÇÃO DA TESE DA INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. PRETENSÃO QUE.
DEMANDA O REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. ELEMENTO SUBJETIVO. DESNECESSIDADE DE
DOLO ESPECÍFICO. CONTINUIDADE DELITIVA. FRAÇÃO DE AUMENTO. CRITÉRIO OBJETIVO.
1. Havendo o Tribunal de origem
assentado, mediante o exame da matéria fática e probatória constante dos autos,
a autoria delitiva e o afastamento da excludente de culpabilidade, tem-se que a
pretensão em sentido contrário, a motivar o presente recurso especial,
demandaria reexame de prova, incabível em recurso especial. Incidência da
Súmula 7/STJ.
2. O crime de apropriação
indébita previdenciária não exige o dolo específico de fraudar a previdência
social (animus rem sibi habendi), bastando a mera intenção de deixar de
recolher os valores devidos a título de contribuição previdenciária.
Precedentes.
3. Não é cabível a diminuição da
fração relativa à continuidade delitiva, porquanto, tendo o réu praticado a
conduta imputada a ele por 63 (sessenta e três) vezes, revela-se adequada a sua
fixação no patamar máximo previsto. Adoção do critério objetivo.
4. Agravo regimental a que se
nega provimento.
(AgRg no REsp 1353240/RS, Rel.
Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 20/06/2013, DJe
28/06/2013)
Este
entendimento acabou prevalecendo na Terceira Seção do STJ, que une ambas as
Turmas, a indicar a uniformização no entendimento daquela Corte. Nesse sentido:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM
RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA
PREVIDENCIÁRIA. DOLO ESPECÍFICO. ANIMUS REM SIBI HABENDI. COMPROVAÇÃO
DESNECESSÁRIA. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. EMBARGOS
ACOLHIDOS.
1. O delito de apropriação
indébita previdenciária constitui crime omissivo próprio, que se perfaz com a
mera omissão de recolhimento da contribuição previdenciária dentro do prazo e
das formas legais, prescindindo, portanto, do dolo específico.
2. Embargos de divergência
acolhidos para cassar o acórdão embargado, nos termos explicitados no voto.
(EREsp 1296631/RN, Rel. Ministra
LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/09/2013, DJe 17/09/2013)
Como
indicado no julgado acima citado, o Supremo Tribunal Federal também tem se
posicionado pela desnecessidade da presença do dolo específico, como comprovam
a AP 516/DF (Pleno), o HC 87.107/SP (Segunda Turma) e o HC 96.092/SP (Primeira
Turma).
Fiquem
conosco!!
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