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Competência: sempre um assunto polêmico...

Caros Amigos,

Hoje vamos falar sobre um recente julgado da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal envolvendo competência, que é sempre uma matéria polêmica.

Trata-se de um caso no qual a acusação foi, originalmente, de contrabando e posse ilegal de armas de fogo, pelo que a denúncia foi direcionada para a Justiça Federal.

No momento de julgar a ação penal, magistrado prolator da sentença aplicou a emendatio libelli e reclassificou a acusação de contrabando como receptação, mas manteve sua competência em virtude do art. 81 do CPP.

Art. 81.  Verificada a reunião dos processos por conexão ou continência, ainda que no processo da sua competência própria venha o juiz ou tribunal a proferir sentença absolutória ou que desclassifique a infração para outra que não se inclua na sua competência, continuará competente em relação aos demais processos.
Parágrafo único.   Reconhecida inicialmente ao júri a competência por conexão ou continência, o juiz, se vier a desclassificar a infração ou impronunciar ou absolver o acusado, de maneira que exclua a competência do júri, remeterá o processo ao juízo competente.

O STJ manteve o entendimento.

Contudo, a Segunda Turma do STF entendeu que o art. 81 do CPP não poderia se sobrepor à competência absoluta prevista na Constituição Federal.

Vejam o teor da notícia:

2ª Turma anula sentença condenatória prolatada por juízo incompetente
Por votação unânime, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu, nesta terça-feira (20), o Habeas Corpus (HC) 113845 para declarar nula sentença condenatória prolatada pelo juízo federal da 8ª Vara Criminal de São Paulo contra D.S.S., pelo suposto crime de receptação e posse ilegal de arma de fogo, e determinar a remessa do processo para a Justiça estadual comum de São Paulo, competente para julgar o caso.
Ao mesmo tempo, a Turma confirmou liminar concedida neste processo, em junho do ano passado, por seu relator original, ministro Cezar Peluso (aposentado), que determinou a expedição de mandado de soltura de D.S.S., por entender que havia razoabilidade jurídica na tese da defesa quanto à alegação de incompetência da Justiça Federal.
O caso
Conforme relatório do ministro Teori Zavascki, que sucedeu o ministro Peluso na Corte e assumiu a relatoria do processo, a denúncia inicial era de contrabando e posse ilegal de arma de fogo. Portanto, em função do crime de contrabando, atraiu a competência da Justiça Federal. Entretanto, em sua sentença condenatória, o juiz federal que julgou o caso reclassificou o crime para receptação e posse ilegal de arma de fogo, crimes que atraem a competência da Justiça estadual.
A decisão de primeiro grau foi contestada pela defesa, e o caso chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Este, no entanto, confirmou a sentença, ante o entendimento de que se tratava de um caso de perpetuação da jurisdição previsto no artigo 81 do Código de Processo Penal (CPP). De acordo com tal dispositivo, tratando-se de crimes reunidos por conexão ou continência (no caso contrabando e posse de arma de fogo), o juiz continuará competente, mesmo que desclassifique a infração para outra que não seja de sua competência.
Divergência
O ministro Teori Zavascki discordou desse entendimento, sendo acompanhado pelos demais ministros presentes à sessão da Turma. Segundo ele, com a reclassificação do crime imputado ao réu, “deixou de existir razão para se instaurar a competência absoluta da Justiça Federal. Isso porque a norma do artigo 81, caput, do CPP, ainda que busque privilegiar a celeridade, economia e efetividade processual, não possui aptidão para modificar a competência absoluta, constitucionalmente estabelecida, como é o caso da Justiça Federal ”.
Assim, segundo o ministro Teori, cabe aplicar ao caso o disposto no artigo 383, caput e parágrafo 2º, do Código de Processo Penal (CPP). De acordo com tais dispositivos, o juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da que conste da denúncia e, quando se tratar de infração de competência de outro juízo, deverá encaminhar os autos do processo.
Segundo o ministro Teori Zavascki, ao prorrogar a competência e julgar o caso, o juiz federal contrariou o princípios constitucionais do juiz natural. Por isso, ele votou no sentido de anular a sentença condenatória e remeter o caso à Justiça estadual de São Paulo.

Logo, para a Segunda Turma do STF, em virtude do princípio do juiz natural, o correto seria aplicar o art. 383 do CPP, que dispõe:

Art. 383.  O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave. 
§ 1o  Se, em conseqüência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto na lei.
§ 2o  Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos.

Recomenda-se a leitura do inteiro teor, assim que disponibilizado.

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