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Uso de passaporte falso: parte II.



Caros Amigos,

Continuamos hoje a tratar acerca da competência para julgar o crime de uso de passaporte falso, em homenagem a queridos leitores, a exemplo de José William Melo Júnior, que inspiraram este post.

Indagaram os referidos amigos sobre o que aconteceria caso o passaporte falso fosse estrangeiro e a apresentação se desse perante empregado de companhia aérea.

Como já havíamos tratado no post de 18 de dezembro de 2013, a apresentação de passaporte estrangeiro falso a empregado de companhia de aviação não atrairia a competência da Justiça Federal brasileira, segundo a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. Afinal, não se trata de falsificação de documento elaborado pela União. Da mesma forma, o uso do passaporte não teria se dado perante servidor público federal.

Vejam o teor do voto da Min. Rosa Weber, no AgReg RE 686241:

Cumpre aqui realizar duas distinções, a primeira quanto ao passaporte em si objeto da falsificação, a outra quanto ao destinatário da apresentação do documento.

Fosse caso de falsificação de passaporte brasileiro, inequívoca a competência da Justiça Federal. Fosse o passaporte falso, brasileiro ou estrangeiro, apresentado à Polícia Federal, igualmente a competência seria da Justiça Federal.

No entanto, aqui, está em causa passaporte falso estrangeiro apresentado a empregado de empresa área privada.

Com efeito, ao contrário do afirmado no recurso, o passaporte estrangeiro falsificado foi apresentado diretamente a empregado de empresa aérea privada, momento em que o falso se consumou, conforme narrativa contida na denúncia.

Somente após a constatação do falso é que provocada a Polícia Federal.

Frisou a eminente Ministra que:

Não muda o quadro o fato de a verificação do passaporte pela empresa área decorrer de imposição da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil). A imposição legal não transforma o empregado da empresa área privada em funcionário público federal, nem os serviços por ele prestados em serviços federais. A lei federal impõe deveres legais a agentes públicos federais, estaduais e municipais e até mesmo a particulares, mas a imposição normativa, por si só, nunca foi considerada como causa suficiente para determinar a competência da Justiça Federal.

Segundo o Min. Luiz Fux:

Senhor Presidente, também verifico que, primeiro, o passaporte não foi expedido pelo Brasil, não é documento nacional brasileiro; segundo, que foi uma falsa identidade ou falsidade, mesmo que material, do documento apresentado a uma funcionária da empresa aérea particular. Isso é nitidamente um delito da competência da justiça estadual, e a incompetência absoluta é enumerada como causa de nulidade absoluta. E uma das consequências da declaração da nulidade absoluta por incompetência é a nulidade dos atos decisórios. Estou de acordo.

A mesma decisão foi reiterada nos autos do RE 632.534, relativo a fatos idênticos. Em ambos, houve voto vencido do Min. Dias Toffoli.

Portanto, da comparação entre todos os julgados mencionados, afigura-se razoável concluir que:

a)    Se a acusação é de uso de documento público falso (passaporte), a competência firma-se em virtude daquele para quem o passaporte foi apresentado.

Se a apresentação se der perante a Polícia Federal, a competência é federal. Se a apresentação se der perante a companhia aérea, a competência será da justiça estadual.

b)   Se a acusação é de falsificação de documento público falso (passaporte), a competência firma-se pela origem do documento. Se a falsificação for de passaporte brasileiro, a competência é federal. Se a falsificação for de passaporte estrangeiro (e a acusação não for por uso perante autoridade federal, mas pelo crime de falso), a competência será da Justiça Estadual.

Fiquem conosco!!










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