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Deslocamento de competência e ratificação da denúncia

Caros Amigos,

São tantos os precedentes relevantes nos últimos informativos dos Tribunais Superiores que sempre tenho dificuldades em escolher o que deve ser comentado.

Vejam só como é interessante o questionamento do julgado de hoje: É necessária a ratificação da denúncia oferecida perante o juiz de primeira instância em caso de posterior diplomação do acusado para prefeito e deslocamento da competência para o Tribunal de Justiça competente?

A matéria foi recentemente enfrentada no seguinte julgado:

DIREITO PROCESSUAL PENAL. RATIFICAÇÃO DA DENÚNCIA NA HIPÓTESE DE DESLOCAMENTO DO FEITO EM RAZÃO DE SUPERVENIENTE PRERROGATIVA DE FORO DO ACUSADO.
Não é necessária a ratificação de denúncia oferecida em juízo estadual de primeiro grau na hipótese em que, em razão de superveniente diplomação do acusado em cargo de prefeito, tenha havido o deslocamento do feito para o respectivo Tribunal de Justiça sem que o Procurador-Geral de Justiça tenha destacado, após obter vista dos autos, a ocorrência de qualquer ilegalidade. Isso porque tanto o órgão ministerial que ofereceu a denúncia como o magistrado que a recebeu eram as autoridades competentes para fazê-lo quando iniciada a persecução criminal, sendo que a competência da Corte Estadual para processar e julgar o paciente só adveio quando iniciada a fase instrutória do processo. Assim, tratando-se de incompetência superveniente, em razão da diplomação do acusado em cargo detentor de foro por prerrogativa de função, remanescem válidos os atos praticados pelas autoridades inicialmente competentes, afigurando-se desnecessária a ratificação de denúncia oferecida. Desse modo, não há que se falar em necessidade de ratificação da peça inaugural, tampouco da decisão que a acolheu, uma vez que não se tratam de atos nulos, mas válidos à época em que praticados. Ademais, não tendo o órgão ministerial — após análise da denúncia ofertada e dos demais atos praticados no Juízo inicialmente competente — vislumbrado qualquer irregularidade ou mácula que pudesse contaminá-los, conclui-se, ainda que implicitamente, pela sua concordância com os termos da denúncia apresentada. HC 202.701-AM, Rel. Ministro Jorge Mussi, julgado em 14/5/2013.

No caso citado, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça respondeu a questão de forma NEGATIVA.

Em seu voto, o Min. Jorge Mussi registrou a existência de entendimentos no sentido de que denúncias apresentadas em juízos absolutamente incompetentes devem ser renovada ou ratificadas.

Entretanto, pontuou que o juízo que recebeu a denúncia era competente ao tempo da sua propositura, bem como que teria havido ratificação de forma implícita.

Pois bem. Inicialmente, no que se refere à alegada necessidade de ratificação da denúncia em razão do deslocamento do feito para o Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas pela diplomação do acusado no cargo de Prefeito Municipal, tem-se que a impetração não merece guarida.

Antes de mais nada, cumpre destacar que não se desconhece a existência de julgados desta Corte Superior de Justiça no sentido de que o oferecimento de denúncia e o seu recebimento por autoridades absolutamente incompetentes ensejam a sua renovação ou a sua ratificação perante o Juízo competente.

Confira-se 

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. FALSIFICAÇÃO DE CTPS. PROCESSO INICIADO NA JUSTIÇA FEDERAL. DECLINATÓRIA EM FAVOR DA JUSTIÇA ESTADUAL. INCOMPETÊNCIA RATIONE MATERIAE.  NECESSIDADE DEREFAZIMENTO DE TODOS OS ATOS, INCLUSIVE O OFERECIMENTO DE NOVA DENÚNCIA.
1. Todos os atos praticados perante juiz constitucionalmente incompetente são absolutamente nulos - ratione materiae. Em tal categoria se inserem o recebimento da denúncia, que não é despacho, mas decisão, e o próprio oferecimento da incoativa.
2. Ordem concedida para anular o processo a partir do oferecimento da denúncia, inclusive.
(HC 99.247⁄SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄SP), Rel. p⁄ Acórdão Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 23⁄02⁄2010, DJe 17⁄05⁄2010)

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. 1. PACIENTE QUE GOZAVA DE FORO ESPECIAL POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. DENÚNCIA OFERECIDA E RECEBIDA PERANTE JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. AUTOS ENCAMINHADOS AO TRIBUNAL A QUO. PROSSEGUIMENTO DO FEITO. NÃO-RATIFICAÇÃO DOS ATOS DECISÓRIOS. INOBSERVÂNCIA DO RITO DA LEI 8.038⁄90. NULIDADE ABSOLUTA. OCORRÊNCIA. 2. ORDEM CONCEDIDA.
1. Tratando-se o paciente de prefeito municipal, que goza, portanto, de foro por prerrogativa de função, e encaminhado o processo ao tribunal a quo após o deferimento de exceção de incompetência, impunha-se a renovação ou ratificação dos atos decisórios, sob pena de nulidade. No caso, diante da inobservância do rito previsto na Lei 8.038⁄90, é de se reconhecer a nulidade do processo desde o início, por se tratar de nulidade absoluta.
2. Ordem concedida para anular o processo, a partir do oferecimento da denúncia, para que seja respeitado o procedimento previsto na Lei 8.038⁄90, aplicável ao caso por força da Lei 8.658⁄93.
(HC 86.837⁄RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 24⁄06⁄2008, DJe 04⁄08⁄2008)

O caso dos autos, contudo, possui peculiaridade que impede o reconhecimento da nulidade da peça vestibular e de seu acolhimento.

É que quando deflagrada a ação penal contra o paciente, este não era detentor de foro por prerrogativa de função, motivo pelo qual foi denunciado perante o Juízo de Direito da comarca de Jutaí⁄AM, que recebeu a inicial ofertada (e-STJ fl. 1970),

Contudo, no curso da instrução processual, o réu foi diplomado Prefeito Municipal, motivo pelo qual os autos foram encaminhados ao Tribunal de Justiça do Estado, consoante a decisão de fls. 2007⁄2008.

Tal panorama fático-processual revela, portanto, que tanto o órgão ministerial que ofereceu a denúncia, assim como o magistrado que a recebeu, eram as autoridades competentes para fazê-lo quando iniciada a persecução criminal, sendo que a competência da Corte Estadual para processar e julgar o paciente só adveio quando iniciada a fase instrutória do processo.

Desse modo, não há que se falar em necessidade de ratificação da peça inaugural, tampouco da decisão que a acolheu, uma vez que não se tratam de atos nulos, mas válidos à época em que praticados, cabendo ao Tribunal de Justiça prosseguir no julgamento do feito, tal como de fato procedeu.

Ademais, há que se ressaltar que assim que os autos foram remetidos ao Tribunal de Justiça, o Desembargador Relator abriu vista ao Procurador-Geral de Justiça do Estado, que, analisando o processo, requereu que o acusado fosse novamente interrogado, seguindo-se a nova sistemática prevista na Lei 11.719⁄2008 (e-STJ fls. 2021⁄2022).

Vê-se, portanto, que o órgão ministerial, após analisar a vestibular ofertada e os demais atos praticados no Juízo inicialmente competente, não vislumbrou qualquer irregularidade ou mácula que pudesse contaminá-los, opinando pelo prosseguimento da ação com o reinterrogatório do réu, o que demonstra que, ainda que implicitamente, concordou com os termos da denúncia apresentada.

Dessa forma, tratando-se de incompetência superveniente, remanescendo válidos os atos praticados pelas autoridades inicialmente competentes, e não sendo destacada qualquer mácula por parte daquelas que se tornaram competentes no curso da ação penal, não há que se falar em nulidade por falta de ratificação da exordial inicialmente oferecida, tampouco em necessidade de intimação da defesa para confirmar sua resposta preliminar.

Recomenda-se a leitura do inteiro teor deste julgado.


Fiquem conosco!!

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