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Súmula Vinculante n. 45

Caros Amigos,

O Supremo Tribunal Federal aprovou nova súmula vinculante sobre a competência constitucional do Tribunal do Júri, a qual ostentará o número 45.

O teor do enunciado não é novo, pois repete o disposto pela Súmula 721 do STF:

A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição Estadual.

Deste enunciado, extraem-se alguma conclusões.

A primeira é que a competência por prerrogativa fixada na própria Constituição Federal prevalece sobre a competência do Tribunal do Júri. Assim, por exemplo, se parlamentar federal é acusado de homicídio, a competência será do STF.

É o que decidiu aquele Tribunal por ocasião da AP 333:

AÇÃO PENAL. QUESTÕES DE ORDEM. CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA IMPUTADO A PARLAMENTAR FEDERAL. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL VERSUS COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. NORMA CONSTITUCIONAL ESPECIAL. PREVALÊNCIA. RENÚNCIA AO MANDATO. ABUSO DE DIREITO. NÃO RECONHECIMENTO. EXTINÇÃO DA COMPETÊNCIA DO STF PARA JULGAMENTO. REMESSA DOS AUTOS AO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU.
1. O réu, na qualidade de detentor do mandato de parlamentar federal, detém prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal, onde deve ser julgado pela imputação da prática de crime doloso contra a vida.
2. A norma contida no art. 5º, XXXVIII, da Constituição da República, que garante a instituição do júri, cede diante do disposto no art. 102, I, b, da Lei Maior, definidor da competência do Supremo Tribunal Federal, dada a especialidade deste último. Os crimes dolosos contra a vida estão abarcados pelo conceito de crimes comuns. Precedentes da Corte.
3. A renúncia do réu produz plenos efeitos no plano processual, o que implica a declinação da competência do Supremo Tribunal Federal para o juízo criminal de primeiro grau. Ausente o abuso de direito que os votos vencidos vislumbraram no ato.
4. Autos encaminhados ao juízo atualmente competente.
(AP 333, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 05/12/2007, DJe-065 DIVULG 10-04-2008 PUBLIC 11-04-2008 EMENT VOL-02314-01 PP-00011)

Semelhante resultado ocorreria se o acusado fosse um desembargador. A competência para processá-lo e julgá-lo seria do STJ, e não do Tribunal do Júri, como decidiu o STF por ocasião do HC 83.583.

COMPETÊNCIA. CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA. ATRACÃO POR CONEXÃO DO CO-RÉU AO FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO.
1. Tendo em vista que um dos denunciados por crime doloso contra a vida é desembargador, detentor de foro por prerrogativa de função (CF, art. 105, I, a), todos os demais co-autores serão processados e julgados perante o Superior Tribunal de Justiça, por força do princípio da conexão. Incidência da Súmula 704/STF. A competência do Tribunal do Júri é mitigada pela própria Carta da República. Precedentes.
2. HC indeferido.
(HC 83583, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 20/04/2004, DJ 07-05-2004 PP-00047 EMENT VOL-02150-02 PP-00280)

Por outro lado, se o foro por prerrogativa de função é estabelecido exclusivamente pela Constituição Estadual, aí prevalece a competência do Tribunal de Júri justamente porque estabelecida na Constituição Federal.

Logo, mesmo que a Constituição Estadual atribua a Procurador do Estado a prerrogativa de foro no caso de crime doloso contra a vida, prevalecerá a competência do Tribunal do Júri, pois constitucionalmente estabelecida.

Neste sentido:

Habeas Corpus. 2. Procurador do Estado da Paraíba condenado por crime doloso contra a vida. 3. A Constituição do Estado da Paraíba prevê, no art. 136, XII, foro especial por prerrogativa de função, dos procuradores do Estado, no Tribunal de Justiça, onde devem ser processados e julgados nos crimes comuns e de responsabilidade. 4. O art. 136, XII, da Constituição da Paraíba, não pode prevalecer, em confronto com o art. 5º, XXXVIII, letra d, da Constituição Federal, porque somente regra expressa da Lei Magna da República, prevendo foro especial por prerrogativa de função, para autoridade estadual, nos crimes comuns e de responsabilidade, pode afastar a incidência do art. 5º, XXXVIII, letra d, da Constituição Federal, quanto à competência do Júri. 5. Em se tratando, portanto, de crimes dolosos contra a vida, os procuradores do Estado da Paraíba hão de ser processados e julgados pelo Júri. 6. Habeas Corpus deferido para anular, ab initio, o processo, desde a denúncia inclusive, por incompetência do Tribunal de Justiça do Estado, devendo os autos ser remetidos ao Juiz de Direito da comarca de Taperoá, PB, determinando-se a expedição de alvará de soltura do paciente, se por al não houver de permanecer preso
(HC 78168, Relator(a):  Min. NÉRI DA SILVEIRA, Tribunal Pleno, julgado em 18/11/1998, DJ 29-08-2003 PP-00019 EMENT VOL-02121-15 PP-02955)

Não é distinta a conclusão no tocante a vereadores, pois estes igualmente não têm prerrogativa de função estabelecida constitucionalmente:

Recurso Ordinário em Habeas Corpus. 2. Homicídio. Competência do Tribunal do Júri para o processo e julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Art. 5º, XXXVIII, d), da Constituição Federal. 3. Não prevalece, na hipótese, a norma constitucional estadual que atribui foro especial por prerrogativa de função a vereador, para ser processado pelo Tribunal de Justiça. 4. Matéria não enquadrável no art. 125, § 1º, da Carta Magna. Cumpre observar, ainda, que a regra do art. 29, X, da Constituição Federal, não compreende o vereador. 5. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento.
(RHC 80477, Relator(a):  Min. NÉRI DA SILVEIRA, Segunda Turma, julgado em 31/10/2000, DJ 04-05-2001 PP-00041 EMENT VOL-02029-03 PP-00614)

Para o Superior Tribunal de Justiça, o caso do vereador é distinto do deputado estadual, pois este, em função da simetria constitucional, ostenta prerrogativa de função garantida pela Constituição Federal. Neste caso, prevalece a competência por prerrogativa de função.

Neste sentido:

HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO ORIGINÁRIA. SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO ORDINÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. RESPEITO AO SISTEMA RECURSAL PREVISTO NA CARTA MAGNA. NÃO CONHECIMENTO. 1. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, buscando dar efetividade às normas previstas na Constituição Federal e na Lei 8.038/1990, passou a não mais admitir o manejo do habeas corpus originário em substituição ao recurso ordinário cabível, entendimento que deve ser adotado por este Superior Tribunal de Justiça, a fim de que seja restabelecida a organicidade da prestação jurisdicional que envolve a tutela do direito de locomoção. 2. Tratando-se de writ impetrado antes da alteração do entendimento jurisprudencial, o alegado constrangimento ilegal será enfrentado para que se analise a possibilidade de eventual concessão de habeas corpus de ofício. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. COMPETÊNCIA. VEREADOR. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO PARA CRIMES COMUNS E DE RESPONSABILIDADE. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PREVISÃO EXCLUSIVA NA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA. TRIBUNAL DO JÚRI. PREVALÊNCIA. ENUNCIADO N.º 721 DA SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. WRIT NÃO CONHECIDO. 1. A competência fixada pela Constituição Federal para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida não pode ser afastada por norma contida exclusivamente em constituição estadual, sob pena de violação a cláusula pétrea. 2. Inteligência do enunciado n.º 721 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. 3. Não há que se falar em competência do Tribunal de Justiça para o julgamento de vereadores acusados da prática de delitos dolosos contra a vida por simetria com a regra aplicada em relação aos deputados estaduais, os quais possuem foro por prerrogativa de função por força de extensão garantida na norma insculpida expressamente no art. 27, § 1.º, da Constituição Federal. 4. Habeas corpus não conhecido.
(STJ, Quinta Turma, HC 220225, Min. Jorge Mussi, DJ 02/10/2013)

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PROCESSUAL PENAL. CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA. DEPUTADO ESTADUAL. ART. 27, § 1º, CF. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO. 1. Apesar de não constar do artigo 27, parágrafo 1º, da Carta Magna, expressamente, a extensão do foro por prerrogativa de função aos deputados estaduais, tem-se que as Constituições locais, ao estabelecerem para os parlamentares do estado idêntica garantia prevista para os congressistas, refletem a própria Constituição Federal, não se podendo, portanto, afirmar que referida prerrogativa encontra-se prevista, exclusivamente, na Constituição Estadual. 2. A adoção de um critério fundado na aplicação de regras simétricas, conforme preceitua a própria Carta Magna, em seu artigo 25, reforça a relevância da função pública protegida pela norma do foro privativo. 3. Conflito conhecido para declarar a competência do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas.
(STJ, Terceira Seção, CC 105207, DJ 25/03/2011)

Recomenda-se a leitura do inteiro teor dos julgados.

Fiquem conosco e indiquem o Blog a quem interessar possa.


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