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Terrorismo e o Ordenamento Jurídico Brasileiro




Caros Amigos,

Hoje, como não poderia deixar de ser, o tema é terrorismo.

O ordenamento jurídico brasileiro menciona “ato de terrorismo” no artigo 20 da Lei 7.170/83:

Art. 20 - Devastar, saquear, extorquir, roubar, seqüestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas.

Pena: reclusão, de 3 a 10 anos.

Parágrafo único - Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até o dobro; se resulta morte, aumenta-se até o triplo.

Contudo, como restou devidamente retratado no Informativo 593 do STF, há respeitáveis vozes a sustentar que inexiste o tipo penal com nomen juris terrorismo no Brasil:

EMENTA: PRISÃO PREVENTIVA PARA FINS EXTRADICIONAIS. EXTRADITANDO SUBMETIDO A INVESTIGAÇÃO PENAL PELA SUPOSTA PRÁTICA DO “DELITO DE TERRORISMO”. CONTROVÉRSIA DOUTRINÁRIA EXISTENTE EM TORNO DA DEFINIÇÃO E DA TIPIFICAÇÃO PENAL DOS ATOS DE TERRORISMO NO ORDENAMENTO POSITIVO BRASILEIRO. O POSTULADO DA TIPICIDADE (OU DA DUPLA INCRIMINAÇÃO) COMO UM DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS AO ATENDIMENTO DO PEDIDO DE EXTRADIÇÃO (E, TAMBÉM, À DECRETAÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR PARA EFEITOS EXTRADICIONAIS). POSTULAÇÃO DEDUZIDA POR ESTADO ESTRANGEIRO, QUE NÃO OBSERVA REQUISITOS IMPOSTOS PELO TRATADO BILATERAL DE EXTRADIÇÃO CELEBRADO COM O BRASIL. INOBSERVÂNCIA, AINDA, DE EXIGÊNCIAS ESTABELECIDAS NO (...). “PACTA SUNT SERVANDA”. PEDIDO DE PRISÃO CAUTELAR, PARA EFEITOS EXTRADICIONAIS, INSUSCETÍVEL DE ACOLHIMENTO, POR ESTAR INSUFICIENTEMENTE INSTRUÍDO. NECESSIDADE DE DILIGÊNCIAS COMPLEMENTARES.

DESPACHO: O (...), com fundamento em tratado bilateral de extradição, celebrado (...) e incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro, mediante promulgação executiva (...), requer, por intermédio de Nota Verbal (fls. 04), a decretação da prisão cautelar de (...), ora submetido, naquele País, a atos de investigação penal, por suposta prática do “delito de terrorismo” (fls. 04).

Cumpre verificar, inicialmente, se a pretensão deduzida pelo (...) satisfaz, ou não, a exigência concernente ao postulado da dupla tipicidade, considerado, para tanto, o crime de terrorismo.

Justifico a indagação em causa pelo fato de o magistério da doutrina advertir que a legislação penal brasileira não teria definido o crime de terrorismo (GILBERTO PEREIRA DE OLIVEIRA, “Dos Crimes Hediondos - Comentários à Lei nº 8.072/90 de 25 de julho de 1990”, “in” RTJTJDFT, vol. 36/35-66; DAMÁSIO E. DE JESUS, “Crime Hediondo Exige Definição Ampla”, “in” O Estado de São Paulo, p. 17, 14/11/1990; ANTONIO LOPES MONTEIRO, “Crimes Hediondos – Textos, comentários e aspectos polêmicos”, p. 124, 7ª ed., 2002, Saraiva; ANDRÉ LUIS WOLOSZYN, “Terrorismo Criminal – Um Novo Fenômeno no Brasil”, “in” Revista da AJURIS, vol. 107/25-26; LUIZ REGIS PRADO e ÉRIKA MENDES DE CARVALHO, “Delito Político e Terrorismo: Uma Aproximação Conceitual”, “in” RT, vol. 771/433-436; CARLOS HENRIQUE BORLIDO HADDAD, “Construindo o Sistema Normativo de Repressão ao Terrorismo”, “in” Revista da AJUFE, vol. 80/63-98).

Impende considerar, sob tal aspecto, e no que concerne à existência, ou não, na legislação brasileira, do tipo penal relativo ao crime de terrorismo, o ensinamento, sempre autorizado, de ALBERTO SILVA FRANCO (“Crimes Hediondos”, p. 116/117, 5ª ed., 2005, RT) cujo magistério, no tema, merece ser transcrito:

“De acordo com o art. 2º da Lei n. 8.072/90, o ‘terrorismo’ será insuscetível de anistia, graça e indulto, não comportando ainda fiança e liberdade provisória. Se estas restrições, de caráter penal e processual penal, se coadunam, ou não, com o art. 5º, XLIII, da Constituição Federal, é matéria de todo irrelevante, nessa altura, pela simples circunstância de inexistir o tipo de ‘terrorismo’, como crime comum ou como crime contra a Segurança Nacional. (...).

.......................................................

A falta de um tipo penal que atenda, no momento presente, à denominação especial de ‘terrorismo’ e que, ao invés de uma pura ‘cláusula geral’, exponha os elementos definidores que se abrigam nesse conceito, torna inócua, sob o enfoque de tal crime, a regra do art. 2º Lei 8.072/90.” (grifei)

Mostra-se evidente a importância dessa constatação, pois, como se sabe, até hoje, a comunidade internacional foi incapaz de chegar a uma conclusão acerca da definição jurídica do crime de terrorismo, sendo relevante observar que, até o presente momento, já foram elaborados, no âmbito da Organização das Nações Unidas, pelo menos, 13 (treze) instrumentos internacionais sobre a matéria, sem que se chegasse, contudo, a um consenso universal sobre quais elementos essenciais deveriam compor a definição típica do crime de terrorismo ou, então, sobre quais requisitos deveriam considerar-se necessários à configuração dogmática da prática delituosa de atos terroristas.

É certo, no entanto, que o dissenso em torno do tema vem suscitando amplo debate na comunidade jurídica, pois é preciso reconhecer que há autores ilustres que sustentam a existência, no ordenamento positivo brasileiro (Lei nº 7.170/83, art. 20), do tipo penal incriminador da prática de terrorismo, valendo destacar, dentre os que assim pensam, a posição de JULIO FABBRINI MIRABETE (“Crimes Hediondos: Aplicação e Imperfeições da Lei”, “in” RT, vol. 663/268-272), de FERNANDO CAPEZ (“Curso de Direito Penal”, vol. 4/640-650, 2006, Saraiva), de PAULO LÚCIO NOGUEIRA (“Dos Crimes Hediondos”, “in” Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, vol. 128/27-28, LEX) e de GUILHERME DE SOUZA NUCCI (“Leis Penais e Processuais Penais Comentadas”, p. 604/605, 2ª ed., 2007, RT).

(...)

O fato do referido art. 20 da Lei 7.170/83 suprir ou não tal lacuna não restou enfrentado no citado julgado, porquanto, em se tratando de extradição, o requisito da dupla tipicidade não exige a existência de tipos penais com o mesmo nomen juris.

Apesar da polêmica, entendo que não seria desarrazoado sustentar que Lei 7.170/83 supriria tal lacuna, pois foi recepcionada pela nossa Constituição em tudo que com ela não conflite, como é o caso do art. 20, acima elencado.

Contudo, pelo contexto político em que foi promulgada a referida norma, há vozes no sentido da sua não recepção, o que é enfatizado mesmo por aqueles que defendem a sua validade.

Independentemente do posicionamento que se adote, é preciso salientar que a iminência de Jogos Olímpicos em nosso país sinaliza para a necessidade da edição de norma que claramente tipifique o delito de terrorismo. Esta solução, já mencionada em post ano passado, também é defendida por boa doutrina.

Além de pacificar questão que enfrenta grande divergência doutrinária, trata-se de uma forma de evitar posteriores alegações de negligência no trato com a matéria, o que não se afigura adequado para um país que repudia explicitamente o terrorismo em sua Constituição, como a República Federativa do Brasil (art. 4º, VIII).

Fiquem conosco!!

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