Caros Amigos,
Recentemente, o
STJ apreciou um caso de um terceirizado que supostamente teria subtraído tóxico
das dependências da Polícia Federal para posteriormente vendê-lo, pelo que
acabou condenado por furto e tráfico, em concurso material.
A Defensoria
Pública da União, então, em sede de habeas corpus, postulou, entre outros
pontos, o reconhecimento do princípio da consunção, de sorte a que o tráfico
absorvesse o furto, tendo em vista que "o furto da substância entorpecente foi praticado exclusivamente para
possibilitar o tráfico da droga subtraída, de modo que, pelo princípio da
consunção, o crime meio (furto) deve ser absorvido pelo crime fim (tráfico),
que é de maior gravidade e penas mais rigorosas".
A Sexta Turma
do STJ, de forma unânime, denegou o habeas corpus. Primeiramente, elencou-se
que o furto, pela sua gravidade, não pode ser considerado ato preparatório do
tráfico, não tendo seu potencial lesivo exaurido neste. Ademais, trata-se de
crimes com bens jurídicos distintos, o que afasta a aplicabilidade do instituto
da consunção.
Vejam a
fundamentação do acórdão.
Extrai-se dos autos que os
acusados subtraíram do interior do Departamento de Polícia Federal em São Paulo
24,855 kg de cocaína, que se encontrava depositada naquele departamento, após
ter sido apreendida em uma investigação policial.
Para realizar tal conduta, os
agentes "valeram-se das facilidades decorrente do fato de trabalharem
naquele departamento como funcionários terceirizados, o que lhes possibilitava
amplo acesso às dependências do prédio, mediante a utilização de cartão magnético
que lhes era entregue." (e-fl. 425).
Dias após a subtração, os
denunciados comercializaram a substância entorpecente, situação comprovada
pelas declarações das testemunhas e pela apreensão de grande quantidade de
moeda nacional e estrangeira na residência dos acusados (R$ 37.000,00; &€$
10.000,00; US$ 19.000,00), quantia esta incompatível com seus rendimentos
(e-fls. 31 e 426).
Com efeito, a descrição dos fatos
deixa evidente que o objeto de ambos os delitos é o mesmo - substância
entorpecente - e o resultado final almejado pelos infratores seria a obtenção
de vantagem financeira com a venda da droga.
Entretanto, para que uma conduta
seja absorvida pela outra é necessário que a primeira sirva apenas como ato
preparatório da segunda, sendo considerada irrelevante e eliminando a autonomia
do referido crime.
No caso, o furto praticado pelo
paciente se deu com abuso da confiança depositada, consistente na subtração de
objeto ilícito, produto de outro crime, e ocorreu dentro das dependências da
Polícia Federal, ludibriando a segurança daquele órgão, não podendo tal conduta
ser considerada desprezível e tampouco simples ato preparatório.
A esse respeito extraio do
acórdão impugnado o seguinte excerto, in verbis:
Com efeito, a conduta dos
acusados reveste-se de caráter anti-social altamente reprovável, pelas
circunstâncias em que foi perpetrado o delito. Ambos tiveram que elaborar plano
engenhoso e rico em detalhes para acessar o 10º andar onde fica o depósito do
NUCRIM, que fica trancado. Demonstraram grande ousadia e completa ausência de
freios inibitórios para a prática de crimes, ao decidirem subtrair o
entorpecente de dentro da própria sede da Polícia Federal.
Alie-se a essas circunstâncias
ainda a grande quantidade de cocaína subtraída - quase vinte e cinco quilos -
que foi recolocada no comércio clandestino de entorpecentes, causando dano à
saúde pública e jogando por terra todo o trabalho policial que havia sido
realizado para sua apreensão. (e-fls. 520⁄521).
Diante de tais elementos, não
vejo como considerar, nessa hipótese, que o crime de tráfico de entorpecentes
seja mais relevante que o furto qualificado, a ponto de eliminar a punição por
este último.
Ao contrário, o modus operandi
utilizado na prática delitiva revela a intensa periculosidade dos agentes e
gravidade concreta da conduta, de modo que o potencial lesivo do furto
praticado não pode ser absorvido pelo tráfico. Além disso, percebe-se que a
ofensa perpetrada em cada um dos delitos se refere a bens jurídicos distintos,
sendo em um protegido o patrimônio da vítima e em outro a saúde pública.
Deste modo, não há que se falar
em aplicação do princípio da consunção, mas em autonomia das condutas.
Este é o HC
150.177/SP e o inteiro teor encontra-se disponível no site do STJ. Recomenda-se
a sua leitura!!
Pelo que sei, o princípio da consunção se aplica no concurso de normas que protegem bens jurídicos diferentes. Se forem iguais, há lugar para o princípio da subsidiariedade.
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