Interceptação telefônica sem autorização judicial é convalidada pela concordância posterior de um dos interlocutores?
Caros Amigos,
É válida uma interceptação
telefônica sem autorização judicial, caso um dos interlocutores consinta
posteriormente com a divulgação do conteúdo?
A 5ª Turma do Superior
Tribunal de Justiça respondeu negativamente, nos termos do julgado abaixo
ementado:
(...)
TRÁFICO DE INFLUÊNCIA (ARTIGO 332 DO CÓDIGO PENAL). GRAVAÇÃO DE CONVERSA
TELEFÔNICA ENTRE O PACIENTE, ADVOGADO, E SUA CLIENTE EFETUADA POR TERCEIRO.
AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. SIGILO VIOLADO. ILICITUDE DA PROVA.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO.
1.
A interceptação telefônica é a captação de conversa feita por um terceiro, sem
o conhecimento dos interlocutores, que depende de ordem judicial, nos termos do
inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal.
2.
A escuta é a captação de conversa telefônica feita por um terceiro, com o
conhecimento de apenas um dos interlocutores, ao passo que a gravação
telefônica é feita por um dos interlocutores do diálogo, sem o consentimento ou
a ciência do outro.
3.
Na hipótese, embora as gravações tenham sido implementadas pelo esposo da
cliente do paciente com a intenção de provar a sua inocência, é certo que não
obteve a indispensável prévia autorização judicial, razão pela qual se tem como
configurada a interceptação de comunicação telefônica ilegal.
4.
O fato da esposa do autor das interceptações - que era uma interlocutora dos
diálogos gravados de forma clandestina - ter consentido posteriormente com a
divulgação dos seus conteúdos não tem o condão de legitimar o ato, pois no
momento da gravação não tinha ciência do artifício que foi implementado pelo
seu marido, não se podendo afirmar, portanto, que, caso soubesse, manteria tais
conversas com o seu advogado pelo telefone interceptado.
(..)
(HC
161053/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe
03/12/2012)
No acórdão, o Min. Jorge
Mussi, na condição de relator, começou diferenciando interceptação, escuta e
gravação telefônica.
A primeira seria a “captação
de conversa feita por um terceiro, sem o conhecimento dos interlocutores, que depende
de ordem judicial, nos termos do inciso XII do artigo 5º da Constituição
Federal”.
No caso da escuta e da
gravação, ao contrário, o conhecimento de um dos interlocutores existe. Na
escuta, a captação é feita por terceiro, ao passo que a gravação é feita pelo
próprio interlocutor. Não existe a necessidade de autorização judicial, mas, em
face ao direito à intimidade, só podem ser utilizadas em legítima defesa do
interlocutor.
Nesse sentido:
PROCESSO
PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. ART. 3.º, II, DA LEI 8.137/90, ART. 325 E 319
DO CÓDIGO PENAL. (1) CARTA ANÔNIMA. PLEITO DE EXCLUSÃO DE TAL ELEMENTO DOS
AUTOS. TEMA JÁ ENFRENTADO EM ANTERIOR HABEAS CORPUS JULGADO POR ESTA CORTE.
COGNIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE: REITERAÇÃO. (2) GRAVAÇÃO AMBIENTAL. REALIZAÇÃO POR
UM DOS INTERLOCUTORES. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA.
(...)
2.
É pacífico, neste Superior Tribunal e no Pretório Excelso, que a gravação
ambiental, realizada por um dos interlocutores, com o objetivo de preservar-se
diante de investida ilícita, prescinde de autorização judicial.
(...)
(RHC
29.156/PR, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em
19/06/2012, DJe 29/06/2012)
Portanto, não há como se
reconhecer a possibilidade de validação
da interceptação por posterior consentimento de um dos interlocutores, pois
isto implicaria em violação a dispositivos constitucional e legal, como
expressamente consignado no julgado:
Com
efeito, a Constituição Federal estabeleceu como garantia individual a
inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas, excetuando-a apenas
quando a interceptação for necessária para fins de investigação criminal ou
instrução processual penal, sempre precedida por ordem judicial.
Para
regulamentar a aludida garantia constitucional, o legislador ordinário editou a
Lei n. 9.296⁄96, na qual foram elencados os requisitos a serem observados para
que a interceptação de comunicações telefônicas seja implementada, dentre os
quais deu destaque para a prévia autorização judicial, conforme o disposto no caput
do seu artigo primeiro:
"Art.
1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para
prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o
disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal,
sob segredo de justiça." (grifo do Relator.)
Não
se pode admitir, portanto, que nenhum tipo de interceptação telefônica seja
validamente inserida como prova em ação penal sem a prévia autorização judicial,
oportunidade na qual o magistrado realiza o controle de legalidade e
necessidade da medida invasiva, em respeito à citada garantia constitucional
que, frise-se, apenas em hipóteses excepcionais pode ser afastada.
Ora, o Estado acusador, para
impor o respeito à lei, não pode vulnerá-la. Veja-se que o argumento do
consentimento posterior não pode vingar, pois, não tendo o interlocutor ciência
da gravação, não se poderia garantir que manteria, da mesma forma, aquele diálogo com o outro
envolvido.
Frise-se que o fato da
gravação ser utilizada em defesa da pessoa que efetuou a interceptação (e não de um dos interlocutores) não
bastou para modificar o entendimento da 5ª Turma, sobretudo em face à vulneração de dispositivo constitucional.
Vale a pena ler o inteiro
teor, bem como aguardar para ver o que o STF, eventualmente, dirá sobre a
matéria.
#Fiquem ligados!!!
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