Caros Amigos,
Seguindo no tópico
interceptação das comunicações telefônicas, faço-lhes a seguinte indagação: é
possível determinar a interceptação das comunicações telefônicas com base em
denúncia anônima, sem investigação prévia?
A 2ª Turma do Supremo
Tribunal Federal respondeu a esta indagação de forma negativa, como recentemente
noticiado no Informativo 692, abaixo transcrito:
Interceptação
telefônica e investigação preliminar
A 2ª
Turma concedeu habeas corpus impetrado em favor de denunciado por crime contra
a ordem tributária (Lei 8.137/90, art.3º, II), assim como por violação do dever
funcional e prevaricação (CP, art.325, §1º, II, c/c art. 319) — com o fim de se
declarar a ilicitude de provas produzidas em interceptações telefônicas, ante a
ilegalidade das autorizações e a nulidade das decisões judiciais que as decretaram
amparadas apenas em denúncia anônima, sem investigação prelminar. Além disso,
determinou a juízo federal de piso examinar as implicações da nulidade dessas
interceptações nas demais provas dos autos. Na espécie, a autorização das
interceptações deflagrara-se a partir de documento apócrifo recebido por membro
do Ministério Público. Este confirmara com delegado da Receita Federal os dados
de identificação de determinada empresa e do ora paciente, auditor fiscal
daquele órgão. Em seguida, solicitara a interceptação, sem, no entanto,
proceder a investigação prévia. Ressaltou-se, no ponto, ausência de
investigação preliminar. Apontou-se que a interceptação deveria ter sido
acionada após verificação da ocorrência de indícios e da impossibilidade de se
produzir provas por outros meios.
HC 108147/PR, rel. Min. Cármen Lúcia, 11.12.2012. (HC-108147)
HC 108147/PR, rel. Min. Cármen Lúcia, 11.12.2012. (HC-108147)
Segundo a notícia (o
acórdão ainda não se encontra publicado), a decisão teve como base dois
argumentos: a) a ausência de
verificação da ocorrência de indícios e a b)
impossibilidade de se produzir provas por outros meios.
Começo o meu comentário
pelo segundo argumento.
Como é cediço, a
interceptação das comunicações telefônicas é um meio especial de investigação
extremamente invasivo, por implicar na devassa da vida íntima não apenas do
acusado, como de terceiros que sequer são objeto da investigação.
Em virtude disto, a
constitucionalidade da medida está condicionada, entre outros elementos, à sua imprescindibilidade.
Afinal, a necessidade, exigibilidade ou indispensabilidade é uma das faces do
princípio da proporcionalidade ou proibição do excesso, juntamente com a adequação
e a proporcionalidade em sentido estrito (Canotilho; Moreira, 2007, p. 393).
Tal constatação fez com
que o Legislador ordinário, ao dispor sobre a interceptação das comunicações
telefônicas, exigisse que a prova não pudesse “ser feita por outros meios
disponíveis” (art. 2º, II, da Lei 9.296/86), a demonstrar que o presente meio de prova é orientado pelo princípio da subsidiariedade.
Nesse sentido:
Habeas
corpus. Constitucional. Processual Penal. Interceptação telefônica. Crimes
supostamente praticados por oficiais de justiça da Comarca de Caruaru/PE.
Eventual ilegalidade da decisão que autorizou a interceptação. Não ocorrência.
Decisão devidamente fundamentada. Indícios suficientes de participação nos
crimes sugeridos. Único meio de prova disponível. Precedentes. 1. É da jurisprudência da Corte o entendimento de que “é
lícita a interceptação telefônica, determinada em decisão judicial
fundamentada, quando necessária, como único meio de prova, à apuração de fato
delituoso” (HC nº 105.527/DF, Segunda Turma, Relatora a Ministra Ellen Gracie,
DJe de 13/5/11). 2. No caso, a decisão proferida pelo Juízo de
piso, autorizando a interceptação telefônica em questão, encontra-se
devidamente fundamentada, sendo os elementos constantes dos autos suficientes
para afastar os argumentos dos impetrantes/pacientes de que não havia indícios
de materialidade em infração penal para se determinar a quebra do sigilo
telefônico ou de que as provas pudessem ser
colhidas por outros meios disponíveis, mormente se levado em conta que as
negociações das vantagens indevidas solicitadas se davam por telefone.
(...) (HC 103418, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado
em 18/10/2011, DJe-216 DIVULG 11-11-2011 PUBLIC 14-11-2011 EMENT VOL-02625-01
PP-00063)
HABEAS
CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. ÚNICO MEIO DE PROVA
VIÁVEL. PRÉVIA INVESTIGAÇÃO. DESNECESSIDADE. INDÍCIOS DE PARTICIPAÇÃO NO CRIME
SURGIDOS DURANTE O PERÍODO DE MONITORAMENTO. PRESCINDIBILIDADE DE DEGRAVAÇÃO DE
TODAS AS CONVERSAS. INOCORRÊNCIA DE ILEGALIDADE. ORDEM DENEGADA. 1. Na espécie, a interceptação telefônica era o único meio viável
à investigação dos crimes levados ao conhecimento da Polícia Federal, mormente
se se levar em conta que as negociações das vantagens indevidas solicitadas
pelo investigado se davam eminentemente por telefone. 2. É lícita a
interceptação telefônica, determinada em decisão judicial fundamentada, quando
necessária, como único meio de prova, à apuração de fato delituoso.
Precedentes. (...)
(HC
105527, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em
29/03/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG 12-05-2011 PUBLIC 13-05-2011)
Da mesma forma:
(...) INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA. ALEGAÇÃO DE NÃO EXAURIMENTO DE OUTROS MEIOS DE PROVA DISPONÍVEIS.
VIOLAÇÃO AO INCISO II DO ARTIGO 2º DA LEI 9.296/1996 NÃO CONFIGURADA.
INTERCEPTAÇÃO AUTORIZADA APÓS A REALIZAÇÃO DE DIVERSAS DILIGÊNCIAS COM O
OBJETIVO DE APURAR A EVENTUAL PRÁTICA DE ILÍCITOS NOTICIADA. DENEGAÇÃO DA
ORDEM.
1. A
interceptação das comunicações telefônicas dos envolvidos não decorreu da
denúncia anônima feita à Ouvidoria Geral do Ministério Público, sendo pleiteada
pelo Parquet e autorizada judicialmente apenas depois do aprofundamento das
investigações iniciais, quando foram constatados indícios suficientes da
prática de ilícitos penais por parte dos envolvidos, tendo o magistrado responsável pelo feito destacado a
indispensabilidade da medida, não havendo que se falar, portanto, em violação
ao princípio da proporcionalidade, tampouco ao artigo 2º, inciso II, da Lei
9.296/1996.
3.
Ordem denegada.
(HC
104.005/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA
TURMA, julgado em 08/11/2011, DJe 05/12/2011)
HABEAS
CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. TORTURA, CORRUPÇÃO PASSIVA, EXTORSÃO, PECULATO,
FORMAÇÃO DE QUADRILHA E RECEPTAÇÃO.
INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA DEFERIDA PELO PRAZO DE TRINTA DIAS CONSECUTIVOS. POSSIBILIDADE.
PRECEDENTE DO STF. DILAÇÃO TEMPORAL JUSTIFICADA NA NECESSIDADE DE APURAÇÃO DOS
INÚMEROS CRIMES PRATICADOS, NA COMPLEXIDADE E PERICULOSIDADE DA QUADRILHA,
CUJOS INTEGRANTES SÃO, EM GRANDE PARTE, POLICIAIS CIVIS.
1. A
Lei nº 9.296/96 autoriza a interceptação telefônica apenas quando presentes
indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal punida com
reclusão e quando a prova não puder ser obtida
por outros meios disponíveis. Estabelece também que a decisão
judicial deve ser fundamentada e a interceptação não pode exceder o prazo de
quinze dias, renovável por igual período, caso
comprovada a sua indispensabilidade.
(...)
(HC
106.007/MS, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA
TURMA, julgado em 17/08/2010, DJe 06/09/2010)
E a imprescindibilidade
de verificação da ocorrência de indícios dos fatos noticiados pela denúncia
apócrifa??
Bem, isto será objeto do
próximo post...
Fiquem conosco!!!
Comentários
Postar um comentário