Caros
Amigos,
Hoje
vamos continuar falando sobre o princípio da insignificância no descaminho.
O
STJ entendeu que a Portaria 75/12 do Ministério da Fazenda não implica em
mudança no parâmetro para o reconhecimento da insignificância em descaminho.
Os
fundamentos encontram-se bem sintetizados na seguinte ementa:
DIREITO PENAL. RECURSO ESPECIAL. 1.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. CRIME DE DESCAMINHO. REITERAÇÃO DELITIVA.
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO APLICABILIDADE. 2. VIOLAÇÃO AO ART. 334 DO CP
E AO ART. 20 DA LEI N. 10.522/2002. OCORRÊNCIA. PARÂMETRO DE DEZ MIL REAIS
FIXADO PELA JURISPRUDÊNCIA COMO INSIGNIFICANTE. RESP N. 1.112.748/TO.
REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. MODIFICAÇÃO LEGISLATIVA POR MEIO DA PORTARIA Nº
75/2012 DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. IMPOSSIBILIDADE. CRITÉRIO FIRMADO PELO
JUDICIÁRIO E NÃO PELO LEGISLATIVO. 3. PORTARIA QUE ADMITE O AJUIZAMENTO DE
EXECUÇÃO FISCAL DE DÉBITO INFERIOR A VINTE MIL REAIS. CRITÉRIO SUBJETIVO. IMPOSSIBILIDADE
DE AFERIÇÃO NAS CORTES SUPERIORES. SÚMULA 7/STJ. 4. VALOR FIXADO
ADMINISTRATIVAMENTE. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA EFICIÊNCIA. CRITÉRIO DE
CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE. NÃO INTERFERÊNCIA NO ÂMBITO PENAL. 5.
RETROATIVIDADE. IMPOSSIBILIDADE. VALORES CONSIDERADOS A PARTIR DA REALIDADE
SÓCIO-ECONÔMICA DO MOMENTO. 6. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A incidência do princípio da
insignificância não se limita ao exame da lesão patrimonial, devendo ser
analisada a efetiva ofensividade da conduta, a periculosidade social da ação e
o grau de reprovabilidade do comportamento. Diante do referido quadro, não há
como se considerar reduzido o grau de reprovabilidade daquele que reitera na
prática de condutas criminosas. Divergência devidamente demonstrada.
2. A Terceira Seção do STJ, ao julgar
o REsp nº 1.112.748/TO, representativo da controvérsia, firmou ser
insignificante para a administração pública o valor de dez mil reais, trazido
no art. 20 da Lei n. 10.522/2002. Portaria emanada do Poder Executivo não
possui força normativa passível de revogar ou modificar lei em sentido estrito.
Outrossim, como é cediço, o patamar utilizado para incidência do princípio da
insignificância é jurisprudencial e não legal. Não foi a lei que definiu ser
insignificante na seara penal o descaminho de valores até dez mil reais, foram
os julgados dos Tribunais Superiores que definiram a utilização do referido
parâmetro, que, por acaso, está expresso em lei, não sendo correto, portanto,
fazer referida vinculação de forma absoluta, ou seja, toda vez que for alterado
o patamar para ajuizamento de execução fiscal estaria alterado o valor
considerado bagatelar.
3. A portaria nº 75/2012 autoriza a
cobrança de créditos inferiores a vinte mil reais, desde que atestado seu
elevado potencial de recuperabilidade, bem como quando, observados os critérios
da eficiência, economicidade, praticidade e as peculiaridades regionais e/ou do
débito, mostrar-se conveniente a cobrança. Dessarte, não é possível conceber,
de plano, como insignificante, a conduta de iludir imposto inferior a vinte mil
reais, porquanto imprescindível o exame de fatores externos à própria conduta
penal, como a viabilidade e sucesso de eventual execução fiscal. Inviável, outrossim,
cogitar-se, de forma peremptória, da majoração do patamar considerado para fins
de incidência do princípio da insignificância, haja vista não se vincular
referida benesse a critérios legais.
4. Na forma como redigidas as
disposições da Portaria nº 75/2012, fica patente o intuito de se otimizar a
utilização da máquina pública, visando deixar de patrocinar execução cujo gasto
pode ser, naquele momento, maior que o crédito a ser recuperado. Portanto, não
há se falar em valor irrisório, mas sim em estratégia de cobrança, o que está
em consonância com o princípio constitucional da eficiência.
5. À época em que se estatuiu, por
meio de lei, o valor de dez mil reais como inviável ao prosseguimento da
execução fiscal, a realidade do país era uma. Ao passo que quando se
estabeleceu, por meio de Portaria, que o valor de vinte mil reais não
justificava o ajuizamento da execução fiscal em que não atestado o elevando
potencial de recuperabilidade do crédito, a realidade era outra.
Patente, assim, que a retroatividade
do novo valor estabelecido desborda da real intenção normativa. A alteração dos
valores que justificam a instauração de execução fiscal é definido dentro dos
critérios da conveniência e oportunidade da administração pública, o que
inviabiliza a aplicação do mesmo entendimento no âmbito penal, haja vista a
grande instabilidade que acarretaria e a enxurrada de revisões criminais que
geraria.
6. Recurso especial a que se dá
provimento, para determinar o prosseguimento da ação penal nº
0005175-98.2010.403.6112, perante a 3ª Vara Federal de Presidente Prudente.
(REsp 1409973/SP, Rel. Ministro MARCO
AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 19/11/2013, DJe 25/11/2013)
A
questão que ficou em aberto é: o que pensa o STF?
A
resposta não é fácil. Afinal, há recente julgado da Segunda Turma do STF sinalizando
que o valor de R$ 20 mil seria aparentemente o novo parâmetro para a
insignificância.
PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE
CONTRABANDO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
REITERAÇÃO DELITIVA. ORDEM DENEGADA. I – Nos termos da jurisprudência deste
Tribunal, o princípio da insignificância deve ser aplicado ao delito de
descaminho quando o valor sonegado for inferior ao estabelecido no art. 20 da
Lei 10.522/2002, com as atualizações feitas pelas Portarias 75 e 130, ambas do
Ministério da Fazenda. II – No caso sob exame, o paciente detinha a posse, sem
a documentação legal necessária, de 22.500 (vinte e dois mil e quinhentos)
maços de cigarro de origem estrangeira, que, como se sabe, é típica mercadoria
trazida do exterior, sistematicamente, em pequenas quantidades, para abastecer
um intenso comércio clandestino, extremamente nocivo para o País, seja do ponto
de vista tributário, seja do ponto de vista da saúde pública. III – Os autos
dão conta da reiteração delitiva, o que impede a aplicação do princípio da
insignificância em favor do paciente em razão do alto grau de reprovabilidade
do seu comportamento. IV - Ordem denegada. (HC 118000, Relator(a): Min.
RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 03/09/2013, PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-182 DIVULG 16-09-2013 PUBLIC 17-09-2013)
Por
outro lado, há recente julgado da Primeira Turma mantendo, aparentemente, o
parâmetro de R$ 10 mil.
PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS
CORPUS. DESCAMINHO (ART. 334, § 1º, C, DO CP). PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
INAPLICABILIDADE. PACIENTE CONTUMAZ NA PRÁTICA DELITIVA. ORDEM DENEGADA. 1. O
princípio da insignificância incide quando presentes, cumulativamente, as
seguintes condições objetivas: (a) mínima ofensividade da conduta do agente,
(b) nenhuma periculosidade social da ação, (c) grau reduzido de reprovabilidade
do comportamento, e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. 2. A
aplicação do princípio da insignificância deve, contudo, ser precedida de
criteriosa análise de cada caso, a fim de evitar que sua adoção indiscriminada
constitua verdadeiro incentivo à prática de pequenos delitos patrimoniais. 3.
No crime de descaminho, o princípio da insignificância deve ser aplicado quando
o valor do tributo sonegado for inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), limite
estabelecido no artigo 20 da Lei 10.522/02, na redação conferida pela Lei
11.033/04, para o arquivamento de execuções fiscais. Todavia, ainda que o
quantum do tributo não recolhido aos cofres públicos seja inferior a este
patamar, a contumácia na prática delitiva obsta a aplicação daquele princípio.
Precedentes: HC 115.514, Segunda Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski,
DJ de 10.04.13; HC 115.869, Primeira Turma, Relator o Ministro Dias Toffolli,
DJ de 07.05.13; HC 114.548, Primeira Turma, Relatora a Ministra Rosa Weber, DJ
de 27.11.12; HC 110.841, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de
14.12.12; HC 112.597, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de
10.12.12; HC 100.367, Primeira Turma, Relator o Ministro Luiz Fux, DJ de
08.09.11. 4. In casu, o paciente foi denunciado como incurso nas sanções do
artigo 334, § 1º, alínea c, do Código Penal, por manter em depósito mercadorias
de procedência estrangeira – 439 (quatrocentas e trinta e nove) armações para
óculos de grau, 222 (duzentos e vinte e dois) óculos de sol e 8 (oito) relógios
– desacompanhadas da documentação fiscal comprobatória do recolhimento dos
respectivos tributos. O valor total do tributo, em tese, não recolhido aos
cofres públicos é de R$ 3.101,15 (três mil cento e um reais e quinze centavos).
5. Destarte, em que pese o valor do tributo sonegado ser inferior ao limite
estabelecido no artigo 20 da Lei 10.522/02, na redação conferida pela Lei
11.033/04, não é possível aplicar-se o princípio da insignificância, porquanto
trata-se de paciente contumaz na prática delitiva. 6. Ordem denegada.
(HC 115154, Relator(a): Min.
LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 25/06/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-160
DIVULG 15-08-2013 PUBLIC 16-08-2013)
O
termo “aparentemente” não foi aleatório, eis que, em ambos os casos, a
insignificância acabou sendo afastada pela existência de contumácia delitiva.
Da mesma forma, em nenhum dos casos o STF produziu fundamentação exauriente
sobre a Portaria 75 e tampouco teve a oportunidade de apreciar os fundamentos
elencados pelo STJ.
Logo,
a sugestão é que a questão seja acompanhada de perto. Recomenda-se a leitura do
inteiro teor dos julgados.
Fiquem
conosco!!
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