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Súmula 526 do STJ

  
Caros Amigos,

O tema de hoje é a Súmula 526 do STJ, que possui a seguinte redação:

“O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato.”

A polêmica decorre de o fato do art. 52, I, da Lei de Execuções Penais estipular que comete falta grave quem pratica fato definido como crime doloso durante a execução penal.

A questão, contudo, é se o reconhecimento da falta grave depende do trânsito em julgado do processo referente ao novo fato? A colocação do reeducando no regime disciplinar diferenciado antes do trânsito em julgado, por exemplo, implicaria em ofensa ao art. 5.°, LVII, da CF?

A resposta, para o STJ, é negativa com base nos fundamentos já elencados por ocasião do julgamento do REsp 1.336.561 – RS, representativo de controvérsia, isto é, o caráter administrativo do procedimento e a existência neste das garantia inerentes ao devido processo legal.

Vejam o que constou no referido inteiro teor:

(...)

Com efeito, trata-se de medida de caráter administrativo que, se tiver de esperar uma ação penal com trânsito em julgado para afirmar, em um contexto de cumprimento de pena, que houve a prática da falta grave, o sentido do sistema disciplinar tornar-se-ia inócuo, mormente porque a punição disciplinar muitas vezes afigurar-se-ia inexequível, já que possivelmente exaurido o procedimento executório.

Ademais, é de lembrar que o procedimento administrativo será conduzido pelas mesmas garantias do processo, porquanto terá de obedecer aos requisitos da ampla defesa e do contraditório, podendo a sua discussão ser devolvida a todas as instâncias judiciais.

(...)

As duas turmas do STF, ainda que em decisões não unânimes, acolheram argumentos semelhantes ao STJ, como demonstram os julgados abaixo:

HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL E DIREITO PENAL. SUBSTITUTIVO DE RECURSO CONSTITUCIONAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. EXECUÇÃO PENAL. FALTA GRAVE. PRÁTICA DE NOVO CRIME. ART. 118, I, DA LEI 7.210/1984. REGRESSÃO DE REGIME. 1. Contra a denegação de habeas corpus por Tribunal Superior prevê a Constituição Federal remédio jurídico expresso, o recurso ordinário. Diante da dicção do art. 102, II, a, da Constituição da República, a impetração de novo habeas corpus em caráter substitutivo escamoteia o instituto recursal próprio, em manifesta burla ao preceito constitucional. 2. O art. 118, I, da Lei 7.210/1984 prevê a regressão de regime se o apenado “praticar fato definido como crime doloso ou falta grave”. 3. Para caracterização do fato, não exige a lei o trânsito em julgado da condenação criminal em relação ao crime praticado. Precedentes. 4. Habeas corpus extinto sem resolução de mérito.
(HC 110881, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 20/11/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-154 DIVULG 07-08-2013 PUBLIC 08-08-2013)

EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. PRÁTICA DE CRIME DOLOSO PELO CONDENADO. FALTA GRAVE. REGRESSÃO DE REGIME. DESNECESSIDADE DE SENTENÇA CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO. PRECEDENTES DO STF. ORDEM DENEGADA. 1. A Lei de Execução Penal não exige o trânsito em julgado de sentença condenatória para a regressão de regime, bastando, para tanto, que o condenado tenha "praticado" fato definido como crime doloso (art. 118, I da LEP). 2. Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.
(HC 97218, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 12/05/2009, DJe-099 DIVULG 28-05-2009 PUBLIC 29-05-2009 EMENT VOL-02362-07 PP-01280 RTJ VOL-00210-03 PP-01213 RMP n. 42, 2011, p. 207-211)

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. REGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL. FALTA GRAVE. FATO DEFINIDO COMO CRIME. SOMA OU UNIFICAÇÃO DE PENAS. BENEFÍCIOS DA EXECUÇÃO. ARTS. 111 E 118 DA LEI 7.210/84. REMIÇÃO. SÚMULA VINCULANTE 9 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. VETOR ESTRUTURAL. ORDEM DENEGADA NA PARTE CONHECIDA. I - A prática de falta grave pode resultar, observado o contraditório e a ampla defesa, em regressão de regime. II - A prática de "fato definido como crime doloso", para fins de aplicação da sanção administrativa da regressão, não depende de trânsito em julgado da ação penal respectiva. III - A natureza jurídica da regressão de regime lastreada nas hipóteses do art. 118, I, da Lei de Execuções Penais é sancionatória, enquanto aquela baseada no incido II tem por escopo a correta individualização da pena. IV - A regressão aplicada sob o fundamento do art. 118, I, segunda parte, não ofende ao princípio da presunção de inocência ou ao vetor estrutural da dignidade da pessoa humana. V - Incidência do teor da Súmula vinculante nº 9 do Supremo Tribunal Federal quando à perda dos dias remidos. VI - Ordem denegada.
(HC 93782, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 16/09/2008, DJe-197 DIVULG 16-10-2008 PUBLIC 17-10-2008 EMENT VOL-02337-03 PP-00520 RTJ VOL-00207-01 PP-00369)

A existência de dissenso em alguns dos julgados, contudo, motivou o reconhecimento da repercussão geral da matéria (RE 776.823/RS). A questão, portanto, será analisada em breve pelo Pleno do STF, quando teremos um posicionamento mais definitivo sobre a questão.

Recomenda-se a leitura do inteiro teor dos julgados.

Fiquem conosco e indiquem o Blog a quem interessar possa.



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