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Licença Prévia para Instauração de Ação por Crime Comum ou de Responsabilidade em Detrimento de Governador



Caros Amigos,

Pode a Constituição Estadual exigir que haja autorização prévia da respectiva Assembléia Legislativa para que seja instaurada ação por crime comum ou de responsabilidade em detrimento de Governador do Estado?

O STF, ao apreciar as ADIs 4791/PR, 4800/RO e 4792/ES, entendeu que sim.

Neste sentido, vejam a notícia extraída do Informativo 774 daquela Corte:

Licença prévia para julgamento de governador em crime de responsabilidade e crime comum - 1

Por violar a competência privativa da União, o Estado-membro não pode dispor sobre crime de responsabilidade. No entanto, durante a fase inicial de tramitação de processo por crime de responsabilidade instaurado contra governador, a Constituição estadual deve obedecer à sistemática disposta na legislação federal. Assim, é constitucional norma prevista em Constituição estadual que preveja a necessidade de autorização prévia da Assembleia Legislativa para que sejam iniciadas ações por crimes comuns e de responsabilidade eventualmente dirigidas contra o governador de Estado. Com base nesse entendimento, o Plenário, em julgamento conjunto e por maioria, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em ações diretas para declarar a inconstitucionalidade das expressões “processar e julgar o Governador ... nos crimes de responsabilidade” e “ou perante a própria Assembleia Legislativa, nos crimes de responsabilidade” previstas, respectivamente, nos artigos 54 e 89 da Constituição do Estado do Paraná. Declarou também a inconstitucionalidade do inciso XVI do art. 29, e da expressão “ou perante a Assembleia Legislativa, nos crimes de responsabilidade”, contida no art. 67, ambos da Constituição do Estado de Rondônia, bem como a inconstitucionalidade do inciso XXI do art. 56, e da segunda parte do art. 93, ambos da Constituição do Estado do Espírito Santo. A Corte rememorou que a Constituição Estadual deveria seguir rigorosamente os termos da legislação federal sobre crimes de responsabilidade, por imposição das normas dos artigos 22, I, e 85, da CF, que reservariam a competência para dispor sobre matéria penal e processual penal à União. Ademais, não seria possível interpretar literalmente os dispositivos atacados de modo a concluir que o julgamento de mérito das imputações por crimes de responsabilidade dirigidas contra o governador de Estado teria sido atribuído ao discernimento da Assembleia Legislativa local, e não do Tribunal Especial previsto no art. 78, § 3º, da Lei 1.079/1950. Esse tipo de exegese ofenderia os artigos 22, I, e 85, da CF.
ADI 4791/PR, rel. Min. Teori Zavascki, 12.2.2015. (ADI-4791)
ADI 4800/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 12.2.2015. (ADI-4800)
ADI 4792/ES, rel. Min. Cármen Lúcia, 12.2.2015. (ADI-4792)

Licença prévia para julgamento de governador em crime de responsabilidade e crime comum - 2

Por outro lado, o Colegiado reconheceu a constitucionalidade das normas das Constituições estaduais que exigiriam a aprovação de dois terços dos membros da Assembleia Legislativa como requisito indispensável — a denominada licença prévia — para se admitir a acusação nas ações por crimes comuns e de responsabilidade, eventualmente dirigidas contra o governador do Estado. Consignou que o condicionamento da abertura de processo acusatório ao beneplácito da Assembleia Legislativa, antes de constituir uma regalia antirrepublicana deferida em favor da pessoa do governador, serviria à preservação da normalidade institucional das funções do Executivo e à salvaguarda da autonomia política do Estado-membro, que haveria de sancionar, pelo voto de seus representantes, medida de drásticas consequências para a vida pública local. Salientou que a exigência de licença para o processamento de governador não traria prejuízo para o exercício da jurisdição, porque, enquanto não autorizado o prosseguimento da ação punitiva, ficaria suspenso o transcurso do prazo prescricional contra a autoridade investigada cujo marco interruptivo contaria da data do despacho que solicitasse a anuência do Poder Legislativo para a instauração do processo, e não da data da efetiva manifestação. O controle político exercido pelas Assembleias Legislativas sobre a admissibilidade das acusações endereçadas contra governadores não conferiria aos parlamentos locais a autoridade para decidir sobre atos constritivos acessórios à investigação penal, entre eles as prisões cautelares. Todavia, a supressão da exigência de autorização das respectivas Casas parlamentares para a formalização de processos contra deputados e senadores (CF, art. 51, I), materializada pela EC 35/2001, não alterara o regime de responsabilização dos governadores de Estado. Isso encontraria justificativa no fato de que — diferentemente do que ocorreria com o afastamento de um governador de Estado, que tem valor crucial para a continuidade de programas de governo locais — a suspensão funcional de um parlamentar seria uma ocorrência absolutamente menos expressiva para o pleno funcionamento do Poder Legislativo.
ADI 4791/PR, rel. Min. Teori Zavascki, 12.2.2015. (ADI-4791)
ADI 4800/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 12.2.2015. (ADI-4800)
ADI 4792/ES, rel. Min. Cármen Lúcia, 12.2.2015. (ADI-4792)

Licença prévia para julgamento de governador em crime de responsabilidade e crime comum - 3

Vencido o Ministro Marco Aurélio, que julgava improcedente o pedido formulado em relação à atribuição da Assembleia quanto aos crimes de responsabilidade, e procedente para afastar a necessidade de licença para fins de persecução criminal contra governador nos crimes comuns. Pontuava que a Constituição estadual poderia reger a matéria pertinente a crime de responsabilidade. Afastava a possibilidade de se cogitar do Tribunal Especial, previsto no art. 78, § 3º, da Lei 1.079/1950, que seria tribunal de exceção, porque não fora criado em norma jurídica, mas estaria apenas previsto sem se ter, inclusive, indicação da composição. Esse Tribunal Especial seria incompatível com o inciso XXXVI do art. 5º da CF, que vedaria juízo ou tribunal de exceção. No que se refere aos crimes comuns, reputava que os artigos 51, I, e 86, da CF, deveriam ser interpretados restritivamente, especialmente porque o texto seria expresso ao tratar do Presidente da República, de modo que não se poderia estender a governador e muito menos a prefeito. Destacava que a competência do STJ para julgar governador de Estado não estaria condicionada a aprovação de licença prévia como se poderia observar do art. 105 da CF. Sublinhava, ademais, que, mantida essa licença, haveria transgressão à Constituição Federal e estaria colocado, em segundo plano, o primado do Judiciário, pois somente haveria persecução criminal por crime comum de governador se ele não tivesse bancada na Casa Legislativa.
ADI 4791/PR, rel. Min. Teori Zavascki, 12.2.2015. (ADI-4791)
ADI 4800/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 12.2.2015. (ADI-4800)
ADI 4792/ES, rel. Min. Cármen Lúcia, 12.2.2015. (ADI-4792)

Grifos meus.

Vejam que as Constituições Estaduais devem “seguir rigorosamente os termos da legislação federal sobre crimes de responsabilidade, por imposição das normas dos artigos 22, I, e 85, da CF, que reservariam a competência para dispor sobre matéria penal e processual penal à União”.

Da mesma forma, frisou-se que a licença prévia, “antes de constituir uma regalia antirrepublicana deferida em favor da pessoa do governador, serviria à preservação da normalidade institucional das funções do Executivo e à salvaguarda da autonomia política do Estado-membro, que haveria de sancionar, pelo voto de seus representantes, medida de drásticas consequências para a vida pública local.”

Não haveria, ademais, prejuízo para a persecução penal pelo fato da prescrição encontrar-se suspensa. O marco interruptivo “contaria da data do despacho que solicitasse a anuência do Poder Legislativo para a instauração do processo, e não da data da efetiva manifestação”.

Sugere-se a leitura do inteiro teor de todos os julgados citados, assim que disponibilizados.


Fiquem conosco e recomendem o Blog a quem interessar possa.


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