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Lei 13.245/16


Caros Amigos,

O post de hoje versa sobre a Lei 13.245/16, que trouxe alterações relevantes ao Estatuto da Advocacia.

O primeiro ponto é uma alteração efetuada no inciso XIV do art. 7º do referido Estatuto, como abaixo se expõe:

Antes
Depois
XIV - examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos;

XIV - examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital;        



A modificação teve o condão de permitir a vista dos autos pelo advogado em qualquer investigação, e não apenas no inquérito policial. Tal mutação é relevante, mormente se considerado que o Ministério Público também pode investigar (STF, RE 593.727 – repercussão geral). Da mesma forma, é coerente com o teor da Súmula Vinculante n.º 14, que permite o acesso aos elementos de prova já documentados pelo defensor. Por fim, houve adaptação do texto para mencionar expressamente o acesso ao procedimento digital, o que é propício em tempos de expansão e consolidação do processo eletrônico.

A Lei 13.245/16 também acrescentou o inciso XXI ao art. 7º do Estatuto da Advocacia, o qual ostenta a seguinte redação:

Inclusão
Veto
XXI - assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração:
a) apresentar razões e quesitos;        
b) (VETADO).        

Alínea ‘b’ do inciso XXI do art. 7o da Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994, alterada pelo art. 1o do projeto de lei
“b) requisitar diligências.”
Razões do veto
“Da forma como redigido, o dispositivo poderia levar à interpretação equivocada de que a requisição a que faz referência seria mandatória, resultando em embaraços no âmbito de investigações e consequentes prejuízos à administração da justiça. Interpretação semelhante já foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal - STF, em sede de Ação Direita de Inconstitucionalidade de dispositivos da própria Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994 - Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (ADI 1127/DF). Além disso, resta, de qualquer forma, assegurado o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder, nos termos da alínea ‘a’, do inciso XXXIV, do art. 5o, da Constituição.”


O mencionado inciso preceitua ser direito do advogado acompanhar seu cliente durante as investigações, “sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente (...)”.

Para tanto, poderá o advogado “apresentar razões e quesitos”, tendo a Presidência da República optado por vetar a possibilidade de realizar diligências.

Primeiramente, há que se salientar que tal dispositivo estabelece uma prerrogativa ao advogado constituído, a qual acabará beneficiando seu cliente. Se a intenção da norma fosse dispor sobre a obrigatoriedade do advogado no inquérito, o Legislador teria optado por fazê-lo forma expressa, dispondo acerca de direito da parte, e não do advogado.

Mas é obrigatória a presença do advogado no inquérito?

A resposta não é simples.

Prevalece, no STJ, o entendimento de que a presença não seria obrigatória (por exemplo, HC 215.335/MS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 11/03/2014, DJe 02/04/2014).

O entendimento é coerente com a premissa de que “eventuais irregularidades verificadas no decorrer do inquérito policial não contaminam a ação penal, tendo em vista que se trata de procedimento inquisitivo que se presta à formação da opinio delicti do Órgão Ministerial” (HC 170.379/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 13/12/2011, DJe 01/02/2012).

Em oportunidade distinta, a Segunda Turma do STF também decidiu que a ausência do procurador “no interrogatório do réu não vicia o ato, mesmo porque o defensor do acusado não pode intervir ou influir nas perguntas e nas respostas. CPP, art. 187. IV”. (HC 74198, Relator(a):  Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 24/09/1996, DJ 06-12-1996 PP-48711 EMENT VOL-01853-03 PP-00561).

Divirjo democraticamente de tal entendimento.

Afinal, o art. 5º da Constituição Federal, no inciso LXIII, dispõe que “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”. Não há, a meu ver, como se dizer que é assegurada a assistência de advogado, se o detido não tem a possibilidade de consultar este profissional antes de prestar declarações à autoridade policial.

Dos argumentos elencados para concluir que a ausência do advogado no inquérito não ocasionaria nulidade, dois não mais procedem.

Afinal, os procuradores atualmente podem fazer questionamentos e influir no inquérito (art. 7º, XXI, a, do Estatuto da Advocacia).

Da mesma forma, a Lei 13.245/16 expressamente superou o entendimento jurisprudencial no sentido de que a nulidade do inquérito não pode atingir o processo. Afinal, todas as provas decorrentes do interrogatório ou depoimento desacompanhado de procurador serão tidas como nulas (art. 7º, XXI, do Estatuto da Advocacia).

Por fim, ainda que a Lei 13.245/16 tenha criado uma prerrogativa ao advogado, ela permite que o cliente com capacidade financeira para contratar um profissional seja obrigatoriamente acompanhado no seu interrogatório. Logo, entender que este direito não deve ser reconhecido ao hipossuficiente violaria o princípio da isonomia (art. 5º, caput, CF).

Repita-se: ainda que eu entenda que exista base constitucional para sustentar a obrigatoriedade da presença do advogado no inquérito, este não é o entendimento predominante hoje, pelo que penso que a Lei 13.245/16 pecou ao não estabelecer este direito de forma clara e expressa.

Superada tal ponderação, convém concordar com o veto presidencial acerca da possibilidade do advogado requerer diligências, justamente porque o procedimento é inquisitório e busca formar o convencimento do Ministério Público acerca da propositura da ação penal. A prova das alegações da defesa incumbe a ela própria, pelo que o advogado deverá diligenciar pessoalmente na obtenção das provas que pretenda juntar.

Por fim, convém comentar os seguintes parágrafos acrescentados pela Lei 13.245/16 no Estatuto do Advogado, abaixo elencado:

Inclusão
Comentário
§ 10.  Nos autos sujeitos a sigilo, deve o advogado apresentar procuração para o exercício dos direitos de que trata o inciso XIV.         

A obrigatoriedade de procuração é restrita ao caso de sigilo.
§ 11.  No caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá delimitar o acesso do advogado aos elementos de prova relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências.

Não haveria ofensa ao direito do contraditório e ampla defesa, pois estes serão diferidos. Após a diligência, a defesa terá amplo acesso a sua documentação. Não há contrariedade à Súmula Vinculante 14, pois esta fala expressamente em elementos de prova “já documentados”.
§ 12.  A inobservância aos direitos estabelecidos no inciso XIV, o fornecimento incompleto de autos ou o fornecimento de autos em que houve a retirada de peças já incluídas no caderno investigativo implicará responsabilização criminal e funcional por abuso de autoridade do responsável que impedir o acesso do advogado com o intuito de prejudicar o exercício da defesa, sem prejuízo do direito subjetivo do advogado de requerer acesso aos autos ao juiz competente.        

O desrespeito ao inciso XIV, o fornecimento incompleto de autos ou a retirada de peças ocaionará a responsabilização criminal (abuso de autoridade, a qual demandará prova do dolo) e funcional da autoridade policial, sem prejuízo do requerimento de acesso aos autos ao magistrado. A criminalização de ato que pode ser desfeito através de simples requerimento ao juízo de acesso aos autos me parece desbordar da razoabilidade e proporcionalidade. Não surpreenderá se a constitucionalidade de tal dispositivo for questionada.

São estas, ao menos, as minhas ponderações preliminares sobre a referida Lei.

Compartilhem e opinem nas pesquisas no Twitter (@blogdireprocpen).

Fiquem conosco e compartilhem!!


Comentários

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Muito me preocupa os anseios da OAB em querer cada vez mais alastrear os direitos dos advogados, até de forma desarrazoada.
    Verdadeiramente não vejo com bons olhos determinados dispositivos inseridos no Estatuto da Ordem. Por mais que entenda a importância de termos uma lei garantidora e disciplinadora do exercício da advocacia, é patente, quando analiso sua mens legis, ao menos sob uma ótica pessoal, percebo um direcionamento não para aplicação da lei e manutenção da ordem pública, mas uma tentativa de se possibilitar a impunidade daqueles que cometem graves infrações, e, portanto, deveriam simplesmente ser punidos. Dessa forma, apesar de entender que todos devemos estar atentos a Princípios basilares como o Devido Processo Legal, a Presunção e Inocência, O Contraditório e Ampla Defesa, entre tantos outros, há que se pensar também na ótica de uma sociedade que clama por justiça e se vê cada dia mais ultrajada com escândalos, sobretudo esses de ordem nacional e que atingem todos os cidadãos de bem.
    Em síntese, não acho que a OAB deveria se posicionar com tanta força, e a qualquer custo, ampliando os direitos dos advogados. Requisitar diligências?! Que bom que foi vetado, porque seria um verdadeiro absurdo. Apesar de ser a sua função lógica, não deveria se afastar, também, de ter um olhar "pro societate", afinal de contas, exerce relevante função social para o país

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