Pular para o conteúdo principal

Alterações Legislativas - Abril e Maio de 2017 (II)



Caros Amigos,

Hoje, o Blog segue analisando algumas relevantes alterações legislativas.

Começamos pela Lei 13.441, de 8 de maio de 2017, que previu “a infiltração de agentes de polícia na internet com o fim de investigar crimes contra a dignidade sexual de criança e de adolescente”.

Para tanto, introduziu 5 (cinco) artigos no Estatuto da Criança e do Adolescente, transcritos a seguir:

Art. 190-A. A infiltração de agentes de polícia na internet com o fim de investigar os crimes previstos nos arts. 240, 241, 241-A, 241-B, 241-C e 241-D desta Lei e nos arts. 154-A, 217-A, 218, 218-A e 218-B do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), obedecerá às seguintes regras: 

I – será precedida de autorização judicial devidamente circunstanciada e fundamentada, que estabelecerá os limites da infiltração para obtenção de prova, ouvido o Ministério Público; 

II – dar-se-á mediante requerimento do Ministério Público ou representação de delegado de polícia e conterá a demonstração de sua necessidade, o alcance das tarefas dos policiais, os nomes ou apelidos das pessoas investigadas e, quando possível, os dados de conexão ou cadastrais que permitam a identificação dessas pessoas; 

III – não poderá exceder o prazo de 90 (noventa) dias, sem prejuízo de eventuais renovações, desde que o total não exceda a 720 (setecentos e vinte) dias e seja demonstrada sua efetiva necessidade, a critério da autoridade judicial. 

§ 1º A autoridade judicial e o Ministério Público poderão requisitar relatórios parciais da operação de infiltração antes do término do prazo de que trata o inciso II do § 1º deste artigo.

§ 2º Para efeitos do disposto no inciso I do § 1º deste artigo, consideram-se: 

I – dados de conexão: informações referentes a hora, data, início, término, duração, endereço de Protocolo de Internet (IP) utilizado e terminal de origem da conexão; 

II – dados cadastrais: informações referentes a nome e endereço de assinante ou de usuário registrado ou autenticado para a conexão a quem endereço de IP, identificação de usuário ou código de acesso tenha sido atribuído no momento da conexão. 

§ 3º A infiltração de agentes de polícia na internet não será admitida se a prova puder ser obtida por outros meios.

Art. 190-B. As informações da operação de infiltração serão encaminhadas diretamente ao juiz responsável pela autorização da medida, que zelará por seu sigilo. 

Parágrafo único. Antes da conclusão da operação, o acesso aos autos será reservado ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia responsável pela operação, com o objetivo de garantir o sigilo das investigações.

Art. 190-C. Não comete crime o policial que oculta a sua identidade para, por meio da internet, colher indícios de autoria e materialidade dos crimes previstos nos arts. 240, 241, 241-A, 241-B, 241-C e 241-D desta Lei e nos arts. 154-A, 217-A, 218, 218-A e 218-B do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal).

Parágrafo único. O agente policial infiltrado que deixar de observar a estrita finalidade da investigação responderá pelos excessos praticados.

Art. 190-D. Os órgãos de registro e cadastro público poderão incluir nos bancos de dados próprios, mediante procedimento sigiloso e requisição da autoridade judicial, as informações necessárias à efetividade da identidade fictícia criada. 

Parágrafo único. O procedimento sigiloso de que trata esta Seção será numerado e tombado em livro específico.

Art. 190-E. Concluída a investigação, todos os atos eletrônicos praticados durante a operação deverão ser registrados, gravados, armazenados e encaminhados ao juiz e ao Ministério Público, juntamente com relatório circunstanciado. 

Parágrafo único. Os atos eletrônicos registrados citados no caput deste artigo serão reunidos em autos apartados e apensados ao processo criminal juntamente com o inquérito policial, assegurando-se a preservação da identidade do agente policial infiltrado e a intimidade das crianças e dos adolescentes envolvidos.

Até o advento da citada norma, a infiltração de agentes era cabível na investigação dos seguintes delitos:

a) crimes previstos na Lei 11.343/06 (art. 53);

b) delitos praticados por organizações criminosas (art. 1º, § 1.º, da Lei 12.850/13);

c) “infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente” (art. 1º, § 2.º, I, da Lei 12.850/13);

d) organizações terroristas (art. 1º, § 2.º, II, da Lei 12.850/13 c/c art. 13.260/16);

e) “tráfico de pessoas cometido no território nacional contra vítima brasileira ou estrangeira e no exterior contra vítima brasileira” (art. 9º da Lei 13.344/16).

A partir do referido diploma, tem-se uma nova hipótese, isto é, os crimes expressamente mencionados acima. O rol é numerus clausus, isto é, é exaustivo, e não exemplificativo.

Para estes delitos, aplicar-se-á o diploma em comento, em face ao princípio da especialidade, o que terá consequências sensíveis.

Assim, por exemplo, nos crimes mencionados na Lei 13.441/17, o prazo da interceptação é de 90 dias, prorrogáveis até 720 dias, ao contrário da Lei 12.850/16, que prevê a infiltração por até 6 meses, sem prejuízo de eventuais renovações, isto é, sem limite final de tempo (art. 10, § 3º).

Vê-se, portanto, que a nova legislação acabou trazendo uma regulamentação mais restrita que a existente para outros delitos, o que não se considera o ideal, tendo em vista a gravidade dos crimes praticados contra a dignidade da criança e do adolescente praticados na internet.

Infelizmente, a brevidade do post não permite um aprofundamento da matéria. Entretanto, para uma melhor compreensão do impacto das mudanças ocasionadas pela Lei 13.441/17, sugiro a leitura do meu artigo na obra "Crimes Cibernéticos", organizada pelo Dr. Angelo Ilha, o qual comentou o então projeto que culminou na promulgação do referido diploma.

Para maiores informações acerca do instituto da infiltração de agentes, sugiro a leitura do meu livro “Agentes Infiltrados”, cuja 2º edição espero em breve publicar, com as alterações trazidas pelas Leis 12.850/16, 13.260/16, 13.344/16 e 13.441/17.

A Lei 13.441/17 entrou em vigor no dia da sua publicação (art. 2º).

Por fim, cabe comentar brevemente a Lei 13.440/17, igualmente promulgada neste 8 de maio, que alterou a redação do parágrafo único do art. 244-A do ECA, nos seguintes termos:

ANTES
DEPOIS
Art. 244-A. Submeter criança ou adolescente, como tais definidos no caput do art. 2o desta Lei, à prostituição ou à exploração sexual:
Pena - reclusão de quatro a dez anos, e multa.

Art. 244-A. Submeter criança ou adolescente, como tais definidos no caput do art. 2o desta Lei, à prostituição ou à exploração sexual:
Pena – reclusão de quatro a dez anos e multa, além da perda de bens e valores utilizados na prática criminosa em favor do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente da unidade da Federação (Estado ou Distrito Federal) em que foi cometido o crime, ressalvado o direito de terceiro de boa-fé.          (Redação dada pela Lei nº 13.440, de 2017)


Veja-se que, ao invés da perda de bens e valores beneficiar a União, como ocorre no Código Penal (art. 91), aqui o montante é destinado para o fundo especializado estadual ou do Distrito Federal.

Da mesma forma, o referido parágrafo trata de “bens e valores utilizados na prática criminosa”, ao contrário do CP, que trata do produto do crime ou de bens equivalentes (art. 91, II, b e § 1.º, CP).

Outra questão digna de nota é que a Lei 13.440/17 decreta a perda de um instrumento do crime, seja este bem ou valor, o que apenas ocorre no Código  Penal caso  estes “consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito” (art. 91, II, a, CP).

Fiquem conosco!

Compartilhem!!


Comentários

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  2. Professor! Estou fazendo meu TCC sobre este tema e já adquiri seu livro “CRIMES CIBERNÉTICOS”, que por sinal é excelente! O professor teria mais materiais que tratam da lei 13.441/2017?
    Att,
    Maria Isabela

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Intimação: advogado constituído x nomeado

  Caros Amigos, Hoje vamos falar de tópico de processo penal que se encaixa perfeitamente em uma questão de concurso: a intimação do defensor dos atos processuais. Pois bem. Dispõe o art. 370, § 1.º, do Código de Processo Penal que " a intimação do defensor constituído, do advogado do querelante e do assistente far-se-á por publicação no órgão incumbido da publicidade dos atos judiciais da comarca, incluindo, sob pena de nulidade, o nome do acusado ". Contudo, o § 4º do mesmo dispositivo afirma que " a intimação do Ministério Público e do defensor nomeado será pessoal ". Assim, para o defensor constituído, a intimação pode se dar pela publicação de nota de expediente, o que inocorre com o nomeado (público ou dativo), que deve ser intimado pessoalmente. Nesse sentido, posiciona-se a jurisprudência do STJ: CRIMINAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. NULIDADE DO JULGAMENTO DO APELO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DOS DEFENSORES NOMEA...

Causa de aumento e conhecimento de ofício

Caros Amigos, O magistrado pode reconhecer, de ofício, a existência de causa de aumento de pena não mencionada  na denúncia? A literalidade do art. 385 do Código de Processo Penal nos indica que não. Afinal, segundo ele, apenas as agravantes podem ser reconhecidas de ofício. Vejam o seu teor: Art. 385.  Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada. Recentemente, o informativo 510 do Superior Tribunal de Justiça indicou que esta seria mesmo a orientação correta. RECURSO ESPECIAL. DESENVOLVIMENTO CLANDESTINO DE ATIVIDADES DE TELECOMUNICAÇÃO. ART. 183 DA LEI 9.472/1997. CAUSA DE AUMENTO APLICADA NA SENTENÇA SEM A CORRESPONDENTE DESCRIÇÃO NA PEÇA ACUSATÓRIA. AUSÊNCIA DE DELIMITAÇÃO DO SUPOSTO DANO CAUSADO A TERCEIRO NA DENÚNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. V...

Crimes Ambientais - Interrogatório da Pessoa Jurídica

Caros Amigos, Os crimes contra o meio ambiente são uma matéria de relevante impacto social, a qual, contudo, ainda não recebe a devida atenção pelos estudiosos do Direito. Como o Blog foi feito para oferecer soluções, teremos neste espaço, periodicamente, discussões sobre este tema. Hoje, o tópico é interrogatório da pessoa jurídica. Sei que muitos jamais refletiram sobre a questão. Entretanto, é algo que ocorre com alguma frequência, já que, diante dos artigos 225, § 3.º, da CF e art. 3º da Lei 9.605/98, é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais. Sendo tal responsabilização constitucional e legalmente prevista, é imprescindível que seja oferecido ao acusado a possibilidade de oferecer a sua versão dos fatos, o que ocorre através do interrogatório. Nos termos do art. 3º da Lei 9.605/98, para que haja a condenação de ente fictício, é preciso que “ a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual,...